Pasta Joia Review - 8
Roteiro dos odores
Se
eu pudesse fechar bem os olhos e sentir apenas os cheiros que alguns lugares da
infância exalavam, em determinadas horas ou circunstâncias, embarcaria numa inebriante
viagem ao passado. Nesse roteiro de odores bons e ruins, percorreria de 10 a 15
quilômetros de ruas e avenidas asfaltadas ou calçadas de pedra, identificando
pelo olfato a passagem pela porta de estabelecimentos comerciais. Um após o
outro.
Nessa
Curvelo dos anos 1970 e 1980 sondável unicamente pelo nariz, o sentido parceiro
do paladar apontaria para locais de pura nostalgia. Saindo da região da atual
rodoviária rumo ao centro, cruzaria a entrada da Torrefação Vera, revelada
pelo constante cheirinho de café moído e torrado lançado ao ar pelas suas
chaminés.
Andando
um pouco mais, meus pés teleguiados pelos aromas parariam em frente ao
alambique Correinha, responsável também pela aguardente de cana Maravilha do
Século XX. Aquele galpão animado pelo engarrafamento de cachaças e pelo vai-vem
de caminhões me lembraria tempo de progresso e de brindes ao luar do
sertão.
Depois
seria a vez de sorver o odor peculiar produzido pela fábrica de caçarolas
Dornas, uma mistura de enxofre e fumaça de fogão de lenha. O perfume levado às
calçadas pela indústria de farinha de ossos também não era dos melhores,
perdendo em fedor apenas pela névoa da refinaria de álcool de mandioca,
deflagrada pontual e diariamente às 18 horas.
Para mim, o melhor de tudo era mesmo
quando se sobrepunha a tudo o onipresente cheiro de terra molhada, apagando a
poeira e acelerando passos e corações, tão logo começava a chover sobre aquele
pequeno município mineiro de tardes quentes e de velhas tradições esquecidas.
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