Pasta Joia Review - 34
A sabedoria do velho tropeiro
Reza
a mitologia grega que quando o titã Prometeu moldou os seres humanos pendurou
neles dois alforjes. Na frente, um acomodava os vícios alheios e, por detrás,
pendia o segundo, a colher os vícios pessoais. Por essa razão é que as pessoas
enxergam com facilidade os erros dos outros, mas ignoram solenemente os seus
próprios.
João
Camilo Penna, mineiro de grandiosos serviços prestados a este país, fez uma
tocante releitura dessa lenda, à luz da sabedoria dos tropeiros que cruzavam as
Minas Gerais na primeira metade do século passado. Conforme a sua versão
sertaneja, inspirada na experiência do pai e do avô, o equilíbrio na montaria
por longas e penosas jornadas representa uma metáfora do bem viver até o
último suspiro de trajetória terrena.
João Camilo Penna
Os
dois sacos que o viajante usa para levar dinheiro e mantimentos ganham outras
posições e serventia mais sofisticada na parábola de Camilo. O da esquerda
carrega as memórias que juntamos na vida, algumas delas muito pesadas. Já o da
direita leva as nossas esperanças de dias melhores e de novas conquistas. A
receita do sábio tropeiro para se chegar ao fim da estrada sem quedas evitáveis
é regular o volume dos alforjes.
Para
isso, o segredo é nunca se esquecer de tirar da esquerda as lembranças amargas
acumuladas ao longo do caminho enquanto também se deve sempre colocar à direita
novos sonhos por realizar. Com isso, nenhum dos lados fica mais pesado que o
outro, o cavaleiro se mantém o tempo todo na vertical e evita ser derrotado
pela fadiga.
O
engenheiro Camilo completa a filosofia compartilhada por outro genial João, o
Guimarães Rosa, lembrando que existem dois tipos essenciais de mineiro, cada
qual com qualidades bem próprias: o das Minas e o dos Gerais. O montanhês é
sonhador e apegado a estudos eruditos. O do sertão é destemido e desbravador.
A
partir desses arquétipos, ele desvenda o porquê de Juscelino Kubitschek ter
sido o mineiro-síntese, sempre vitorioso graças à capacidade de combinar
características fortes de cada uma das figuras-padrão. Nascido em Diamantina,
cidade montanhosa que também é o porta de entrada para do Vale do
Jequitinhonha, JK foi excepcionalmente tão refinado quanto ousado.
O construtor de Brasília era um cidadão
simples, tal qual os com os quais tomava café à beira do fogão de lenha. Mas
também era um elegante exemplar dos anos dourados, recepcionando estrelas de
Hollywood em requintados jantares. Obrigado, mestres Joões por estórias como
essas, que nos faz honrados de nossas origens.
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