A conta do consumismo

Sílvio Ribas Ao governo não faltou apenas realismo nas projeções de crescimento da economia nos últimos anos. Houve também desleixo com a perigosa evolução de indicadores puxados pelo poder de compra da população e pela farta oferta de crédito. O resultado disso está na persistente inflação, no elevado nível de endividamento das famílias e, sobretudo, na deterioração das contas externas, que registram as compras e as vendas de mercadorias e de serviços entre o país e o resto do mundo. Apesar das vantagens proporcionadas pelas cotações elevadas das matérias primas que se destacam na pauta brasileira de exportações, como soja e minérios, a poupança interna diminuiu e o saldo das transações correntes com o exterior recuou, progressivamente, criando um forte obstáculo para o crescimento sustentado do país. De 1999 a 2004, as exportações e as importações avançaram, respectivamente, 11,2% e 2,2% ao ano. Após essa temporada, veio outra, de 2004 a 2012, marcada pela demanda desenfreada. Nela, o ritmo nas duas mãos do comércio exterior se inverteu: alta média de 3,4% para exportações e de 11,9% para as importações. “É uma pena que tenhamos perdido essa oportunidade”, comentou ao Correio Fábio Giambiagi, economista do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Segundo ele, a crescente piora nos saldos comerciais deixou explícitos erros da política econômica. As motivações eleitorais levaram o Planalto a ignorar sinais de desequilíbrio que exigiam correções de rumo e ajustes, deixados de lado em nome da manutenção de altos índices de popularidade da presidente Dilma Rousseff. O consumo das famílias saltou de um crescimento anual médio de 1,9%, no período 1999-2004, para 5% nos anos 2004-2012.
Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central (BC), ressaltou que o avanço do consumo interno a um ritmo pelo menos um ponto percentual acima do Produto Interno Bruto (PIB) deixou desequilíbrios na balança comercial e em outras contas que hoje limitam o crescimento da economia. O diretor do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas, Luiz Guilherme Schymura, destacou que em apenas seis anos, de abril de 2007 a abril de 2013, as contas correntes do país pioraram em 4,23 pontos percentuais do PIB. Neste tempo, o país saiu de um superavit acumulado em 12 meses superior a 1% para um deficit de 3%, sendo que 84% deste avanço se refere à piora da balança comercial. Apesar disso, “a forte e persistente desvalorização do real nas últimas semanas parece indicar que algum tipo de ajuste no balanço de pagamentos já está em curso”, disse Schymura. Esse acerto, acrescentou, logo terá impacto nas taxas de consumo e de investimento, a depender da conjuntura externa. Mas, para piorar, as condições de fluxo internacional de capitais e de comércio internacional, afetado pela China, não são mais favoráveis ao país.

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