A presidente e o príncipe

Sílvio Ribas A piora nas relações com o Congresso, os gigantescos protestos de rua contra a péssima qualidade dos serviços públicos e as inquietações com o minguante desempenho da economia desafiam a presidente da República na condição de representante número um da classe política brasileira. Apesar disso, assessores próximos de Dilma Rousseff insistem em dizer a ela que as turbulências dentro e fora do governo devem ser enfrentadas apenas com as ferramentas da comunicação. Para a turma que cerca o gabinete presidencial e leva sob o braço pesquisas de opinião e cópias de artigos publicados na imprensa, a superação do momento ruim está nas mãos da boa gestão da crise. Com reputação em risco e quedas nas pesquisas pré-eleitorais, o marketing do Planalto, reforçado por assessores especiais convocados de última hora, tratou de colocar em prática ações para proteger os interesses do Executivo e reestabelecer uma suposta normalidade. Neste pacote, são mensurados desde o discurso e a apresentação da governante a até detalhes de sua roupa e a agenda de encontros reservados com grupos sociais, montada em razão das fotos a serem divulgadas. Acredito que esse esforço não está de todo errado. Mas é bom ouvir o argumento sensato de analistas e parlamentares que consideram a crise com cores sociais e econômicas fruto da falta de articulação política. Essa é uma boa hora para a chefe do Executivo, uma leitora contumaz, reler a obra clássica O príncipe, de Nicolau Maquiavel, que acaba de completar 500 anos. O texto chegou bem atual à metade de seu primeiro milênio, como um clarividente roteiro para governantes estreantes, caso dela, em seu primeiro mandato eletivo. O maior partido aliado de Dilma, o PMDB, consegue ser mais maquiavélico, no bom sentido, que o governo, ao reagir politicamente à realidade e não só midiaticamente. O príncipe aconselha a agir não conforme as virtudes, mas sempre conforme as necessidades do momento. Não falo da máxima atribuída ao autor italiano de que “os fins justificam os meios”, mas da contingência de quem governa. É preciso a tal virtú para não deixar o urgente para depois e fazer autoelogio apenas em parcelas. Se inverter essas duas recomendações, o resultado pode ser pior que os desafios colocados. Fonte: Correio Braziliense de ontem

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