Apelo ao capital privado

Por Sílvio Ribas A economia brasileira, que já vinha sofrendo com a inflação resistente, o crescimento pífio e os efeitos negativos desses dois sobre a confiança dos mercados, começou este semestre pressionada por dois novos fatores. O primeiro foi os rescaldos políticos da onda de protestos populares e o segundo com o desesperado cronograma federal de concessões de infraestrutura, a única aposta segura do governo para dar eficiência econômica ao país e impedir que a recessão se instale num futuro próximo, levando ao maior dos pesadelos, a alta do desemprego. Além de cobrar total empenho dos ministros envolvidos para garantir que todas as licitações já anunciadas de portos, aeroportos, rodovias, ferrovias e poços de petróleo evoluam sem se perder na desconfiança dos investidores nacionais e estrangeiros, a presidente Dilma Rousseff está preocupada em destravar projetos dentro do curto prazo deixado pelo calendário eleitoral. O Planalto não mais esconde os seus temores de que a queda de popularidade e a piora do cenário externo criem barreiras a objetivos traçados em 2011 para serem entregues no atual mandato. Prova disso é que, nos últimos 10 dias, autoridades do primeiro escalão federal, incluindo a própria presidente, vieram a público para apontar avanços protocolares nos capítulos atuais de transferência de ativos à administração privada. Após trâmites conturbados no Congresso do arcabouço legal dos investimentos e a decepção dos empreendedores-alvo com o viés intervencionista dos planos, Dilma redobra esforços para convencer os convidados para os leilões sobre a confiança jurídica dos novos contratos, os riscos mitigados e a rentabilidade justa. Esse discurso presidencial é repetido cotidianamente pelos ministros Gleisi Hoffmann (Casa Civil), César Borges (Transportes), Moreira Franco (Aviação Civil) e Leônidas Cristino (Portos), reconhecendo o papel complementar do investimento privado ao contido investimento estatal e, mais ainda, enaltecendo sua capacidade de tirar grandes obras do papel com mais rapidez e menor custo. A reaproximação do Estado com o mercado ditada pelo período curto e incerto até as urnas já produziu revisões nas taxas de retorno ao capital investido nos projetos, eliminação de etapas burocráticas, mais prazo de concessão e até inesperados bônus de ativos aos certames. Apelidado nos bastidores de PAC3 – uma abordagem marqueteira dos martelos batidos nas concessões, em paralelo ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC2), carro-chefe dos investimentos da União em infraestrutura – esse bonde tem as próximas e decisivas estações desejadas concentradas nos meses de agosto, setembro e outubro deste ano. O empenho federal é para tentar assinar todos os contratos até o Carnaval, antes de cair no limbo (oficial e oficioso) das campanhas eleitorais, entre abril e outubro de 2014. Tudo isso vai depender do apetite dos investidores e do crivo do Tribunal de Contas da União (TCU). Neste sentido, não tem faltado reuniões de técnicos do governo com representantes do capital e com analistas do órgão de controle, para sanar dúvidas e evitar dissabores de última hora. Nas últimas semanas, o Planalto passou a admitir até mesmo mudanças na Lei de Licitações (8.666), em vigor há 20 anos, para driblar a burocracia da mesma forma que já fez com o regime diferenciado de contratações (RDC). Um capítulo à parte da aflição do governo em viabilizar os investimentos em infraestrutura é o projeto do trem de alta velocidade (TAV), entre as capitais do Rio de Janeiro e São Paulo, o maior deles, orçado em R$ 34 bilhões. Depois do primeiro leilão frustrado, o governo dividiu a licitação em duas, para separar risco da obra de risco de operação. Mais recentemente, com manifestações em todo país por mais atenção à mobilidade urbana, o pacote foi valorizado com exploração imobiliária das estações e entornos. O avanço só não foi maior porque a tentativa do presidente da Empresa de Projetos Logísticos (EPL), Bernardo Figueiredo, de ampliar o retorno interno de investimento (8,5%) esbarrou no secretário do Tesouro, Arno Augustin, que fixou em 7%. Nesse meio tempo, a pregação de Figueiredo de que o TAV concorre com a ponte aérea e não com metrôs também precisou ser calibrada. Segundo ele, o fluxo de passageiros entre os aeroportos de São Paulo e Rio de Janeiro saltou de 4,4 milhões por ano em 2008 para 7,45 milhões no ano passado. Um fato que quase passou batido é que o plano de concessões de mais 11 mil ferrovias a serem construídas pela iniciativa privada, dentro de um novo modelo no qual o setor público, representado pela estatal Valec, assume todo o risco de demanda, acabou completando um vácuo no projeto da Ferrovia Norte-Sul (FNS). Em obra há 26 anos, a “espinha dorsal” do sistema ferroviário brasileiro pode ficar pronta até o fim do próximo ano. Além da Vale, que explora um trecho ao norte, até o litoral maranhense, o governo decidiu que os concessionários de ferrovias a serem licitadas nos próximos meses ficarão responsáveis pela gestão de segmentos de linhas da FNS nos quais se conectarão. Não bastasse todos esses problemas internos e externos à gestão federal, os estragos no mercado financeiro tendo o empresário Eike Batista, do grupo EBX, como símbolo das expectativas frustradas, jogaram luz sobre o elevado grau de comprometimento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no esforço federal para colocar projetos na rua. A escolha de Eike e outros poucos como modelos de efetivo “espírito animal” de empreendedores na área de infraestrutura não colheu o resultado desejado e ainda deixou prejuízos. Nos últimos dias, o governo e empresários avaliam caminhos alternativos de financiamento ao setor. A Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), por exemplo, já conversa com bancos privados e com a Caixa Econômica Federal na tentativa de debater caminhos para encontrar recursos extras à infraestrutura. Paulo Godoy, presidente da entidade admitiu que a torcida é para os bancos privados elevarem sua participação nos financiamentos, incluindo estruturas de dívida e de capital. OBS; foto do aeroporto Charles De Gaulle, que fiz em 2012.

Comentários