Apagão digital

Sílvio Ribas

Mais de 10 mil sites no mundo, inclusive no Brasil, se juntaram ao "apagão digital", protesto liderado ontem pelo Wikipedia, maior enciclopédia on-line, e pelo site de notícias sociais Reddit. As empresas da internet tiraram páginas do ar por 24 horas em reação a dois projetos de lei que punem a pirataria de conteúdo, em tramitação na Câmara e no Senado dos Estados Unidos. Apesar da grande expectativa, outros gigantes da internet, como Google, Facebook, Twitter e Amazon, apoiaram o movimento, mas não aderiram.

As empresas de tecnologia se mostram preocupadas com os projetos conhecidos pelas siglas em inglês Sopa (Lei para parar a pirataria on-line) e Pipa (Lei de proteção à propriedade intelectual), que têm o apoio de grandes estúdios de cinema, gravadoras de música, editoras e outras companhias, que alegam perder bilhões de dólares em razão da pirataria. A votação no Congresso norte-americano está prevista para fevereiro.

Desde a madrugada de ontem, os portais do Wikipedia (na versão em inglês) e do Reddit escureceram suas páginas para que os visitantes só pudessem encontrar informações sobre os dois projetos. Até mesmo o governo dos EUA manifestou, no sábado, receio com os prováveis efeitos negativos de uma nova legislação, como censura à rede e inibição à criatividade. Além de restringir o acesso e os pagamentos a sites de fora dos EUA que oferecem conteúdo apropriado de outros ou falsificado, os projetos preveem até prisão dos responsáveis.

A esperança dos sites é que, caso os projetos sejam aprovados, a Casa Branca tome uma posição favorável a eles. O presidente Barack Obama indicou que poderá vetar total ou parcialmente. "Ao mesmo tempo em que acreditamos que a pirataria on-line por sites internacionais é um problema sério que requer uma resposta legislativa séria, não apoiaremos leis que reduzam a liberdade de expressão, aumentem o risco cibernético e limitem a dinâmica e inovadora internet global", assinalou o comunicado do governo.

Apesar dessas declarações, a baixa adesão de outras marcas de peso revelou que elas não estão dispostas a sacrificar um dia do faturamento e correr o risco de uma reação negativa do público para pressionar os congressistas. Nos EUA, o Google chegou a exibir uma tarja negra na frente de seu logotipo, mas nada que impedisse o usuário de fazer buscas.

"Nos opomos a esses projetos porque há formas inteligentes e dirigidas de fechar sites estrangeiros insubordinados sem pedir que companhias norte-americanas censurem a internet", informou o Google por um porta-voz. Ontem, o criador do Facebook, Mark Zuckerberg, rompeu um silêncio de três anos sem tuitar: "Diga ao seu congressista que você quer que ele seja pró-internet". Várias outras empresas conhecidas, como eBay e Mozilla, também criticaram os projetos, mas sem tirar os serviços do ar.

O presidente da Comissão de Justiça da Câmara dos EUA, Lamar Smith, um dos autores do projeto Sopa, disse que o "apagão digital" foi só "um golpe publicitário", além de "um desserviço aos seus usuários" movido pelo medo. Na véspera do protesto, o fundador do Wikipedia, James Wales, postou um aviso, pedindo apoio dos usuários ao movimento. "Aviso aos estudantes! Faça seu dever de casa mais cedo. A Wikipedia irá protestar contra uma lei ruim na quarta-feira", tuitou. Em outro post, Wales encorajou os leitores a entrarem em contato com parlamentares para pedir o voto contra as propostas.

Pelo menos um senador norte-americano, o republicano Marco Rubio, parece ter recuado em razão do protesto. Ontem, ele retirou sua assinatura do projeto Pipa, que prevê o bloqueio de sites que publicarem conteúdos que firam leis de direitos autorais. O parlamentar da Califórnia fez seu anúncio em um post no Facebook, intitulado "Uma maneira melhor de lutar contra o roubo de ideias e empregos norte-americanos".

Turma da Mônica
Uma das adesões brasileiras ao "apagão digital" foi do site da Turma da Mônica. A página ficou um dia fora do ar "por não concordar com as limitações" que os projetos de lei antipiratia dos Estados Unidos "imporão à internet", avisou o comunicado postado pelo desenhista Mauricio de Souza. A página explica que os projetos têm o objetivo de coibir a pirataria, mas afetarão sites que utilizam diariamente graças à possibilidade de serem bloqueados sem qualquer aviso prévio. "Há outras formas de coibir a pirataria sem que se crie um ambiente de censura na rede", afirmou. "Por aqui, a única Sopa que apreciamos é a que a Magali toma. E Pipa, só a amiga da Tina ou aquela que voa livre pelos céus."


Fonte: Correio Braziliense/Diário de Pernambuco - 19 de janeiro de 2012

Comentários