Provocações de ano-novo

Por Sílvio Ribas O Congresso Nacional já apagou as luzes de 2014 e logo mais o Executivo e o mercado financeiro farão o mesmo. Como a grande expectativa em relação ao ano-novo gira em torno do tamanho e da variedade das “medidas drásticas” de ajuste fiscal a serem adotadas no começo do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, a agenda econômica de alcance estratégico vai ficar ainda mais no fundo das gavetas do Planalto. Isso porque a novela estrelada pelos cortes orçamentários e pelas sobretaxas não dará espaços para debates mais elaborados e desafiadores. Apesar dessa constatação óbvia, gostaria de deixar aqui algumas provocações para a equipe econômica e para os pensadores da academia. Alguns podem enxergar nelas sandices monumentais e outros podem até coçarão a cabeça. Acredito, contudo, ser mais importante não deixar que o caos do descontrole econômico e as respostas urgentes para debelá-lo nublem outras mazelas ainda mais enraizadas. A primeira provocação envolve o maior complicador para a recuperação da confiança no governo atualmente: a gestão temerária da Petrobras. Por que o futuro e renovado Conselho de Administração da estatal não avalia a real necessidade de um conglomerado tão amplo e diversificado? A verticalidade da companhia, que vai do mais profundo poço do pré-sal à bomba de gasolina, não a torna mais vulnerável a malfeitos? Os rombos nas áreas de refino e de abastecimento não mereceriam uma revisão estratégica? É algo a se pensar. Outra sugestão incômoda e igualmente polêmica envolve a abertura de capital de grandes estatais federais, como a Infraero e os Correios. O momento não é nada favorável ao lançamento de ações nas bolas daqui e de Nova York, mas procurar canais de transparência e de reforço à governança deveria ser visto como algo louvável. Dilma já sinalizou a inclusão da Caixa, uma empresa pública, no clube das sociedades anônimas, onde já estão Petrobras e Banco do Brasil, sem fixar qualquer prazo. O que o futuro titular da Fazenda, Joaquim Levy, teria a dizer sobre esse tema? Abertura seletiva No terreno do comércio exterior, cujos números consolidados voltaram a ser pintados de vermelho, pergunto se não é hora de o governo facilitar a inserção do país nas grandes cadeias produtivas globais, garantindo a livre entrada de componentes especiais, de diversas origens, para serem daqui reexportados na forma de outros produtos. Zerar impostos sobre a produção nacional de placas de geração de eletricidade pela luz solar ou sobre microchips traria benefícios múltiplos. Mas também seria bom tirar proteções a um hipotético conteúdo local, que nunca se efetiva. Na defesa de uma série de pequenos negócios, deixamos de participar de outros grandes e realmente transformadores. Minha lista irritante também teria uma proposta de proibir gradualmente a criação de gado na Amazônia, outra de extinção do desacreditado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e ainda de revisão das cláusulas movediças do Mercosul. Por fim, o que poderia ser mexido na legislação trabalhista para tornar o mercado de trabalho dinâmico e competitivo, sem, entretanto, permitir a exploração do trabalhador? Para a maioria das autoridades, esse tema é, desde a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), intocável. A própria presidente da República já ressaltou na campanha eleitoral que “nem que a vaca tussa” aceitaria qualquer mudança. Mas assalariados ainda ganham pouco e custam caro na folha, sem falar que não podem aplicar o fundo de garantia em coisa mais rentável. Fonte: Correio Braziliense, coluna Correio Econômico, 23 de dezembro, terça-feira.

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