A turma do U

Por Sílvio Ribas A última vez que me encontrei com o então ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), o baiano Jorge Hage, fiquei impressionado com a sua disposição em convencer pessoas comuns da importância de defender o bolso do contribuinte. “Dinheiro público é dinheiro do público”, repetia ele a todos com quem conversava, desde o mais humilde cidadão à mais alta autoridade. Na última segunda-feira, ele se despediu do cargo que ocupou por 9 anos, afirmando ter cumprido o dever, mas se queixando suavemente das limitações do órgão ligado ao governo federal dedicado ao combate dos malfeitos envolvendo servidores e prestadores de serviços ao Estado brasileiro. “Já dei a minha contribuição. Está na hora de descansar”, resumiu. A saída de cena de Hage, nos estertores do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, ocorre também no mesmo momento que a mais antiga e vultosa relação promíscua entre os setores público e privado vem à tona. Aquilo que estava claro apenas para a intuição popular, de que a corrupção é ampla, geral e irrestrita no que se refere às máquinas de governo dos três níveis, foi objeto de investigação séria. Também está ficando cada vez mais patente o quão limitado é mesmo a capacidade da chamada “turma do U” — CGU, Tribunal de Contas da União, Advocacia-Geral da União (AGU) e Ministério Público da União (MPU) —, alguns mais, alguns menos, para enfrentar a chaga da corrupção, presente antes da proclamação da República e dona de uma incrível capacidade de adaptação aos novos tempos. Os órgãos federais de controle, ao que tudo indica, levaram uma goleada dos corruptos e corruptores. As explicações possíveis são as de que faltou autonomia, faltaram recursos financeiros e humanos para robustecer sua atuação e, sobretudo, faltou respaldo político à atuação imprescindível deles. A percepção do senso comum é que os grandes esquemas têm uma desenvoltura difícil de explicar. Seria injusto dizer que as quatro siglas “não fizeram nada” para impedir a bandalheira, particularmente na Petrobras. Dezenas de bilhões de reais desviados desde a última década dos cofres públicos sacrificaram o caixa e a reputação da maior empresa brasileira, cujo valor de mercado despencou do primeiro para o quarto lugar na Bolsa de Valores de São Paulo (Bm&FBovespa) Mas também é fato de que a organização delas precisa ser repensada para responder aos desafios passados e futuros. Os milhares de funcionários de estatais e ministérios afastados durante a gestão de Hage são um dado importante, sobretudo considerando que a CGU ainda atua, em boa parte, apenas graças a auditorias feitas aleatoriamente, fruto de amostragem. O Brasil evoluiu e deixou no passado situações absurdas e até folclóricas na administração pública, como as de um prefeito do interior com o cofre da Prefeitura no bolso. Informações de compras grandes e pequenas da União publicadas na internet, operações da Polícia Federal, conselhos civis de acompanhamento de obras, entre outros instrumentos contam muito a favor da transparência. É, contudo, preciso avançar bem mais, jogando luz sobre todo os cantos escuros do Leviatã e sobre as inúmeras práticas usadas para despistar ou comprar a fiscalização oficial. O descalabro fiscal dos governos federal e distrital também é uma prova cabal de que a defesa do “dinheiro do público” requer mobilização social e reformas institucionais.

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