Tombo na curva

Sílvio Ribas Proteger a vida como bem supremo, buscar modelos de produção éticos e socialmente responsáveis e, por fim, dar condições de trabalho dignas e justas. Essas três premissas estavam contempladas na chamada Lei dos Caminhoneiros, que consumiu mais de uma década em debates dentro e fora do Parlamento antes de ser votada e, em mais de um ano em vigor, encontrava obstáculos para sair do papel. Pois não é que a Câmara dos Deputados aprovou na semana passada mudanças no regime que regulamenta a atividade dos profissionais da estrada? Entre as mexidas no texto, está o aumento da jornada de trabalho, justamente o ponto central da legislação e uma das principais reivindicações dos empregados de transportadoras. A sessão do último dia 29, véspera do feriadão do Primeiro de Maio para o expediente parlamentar, teve ainda a marca das vergonhosas claques, com o aluguel de manifestantes pró-reforma da lei, nas galerias do plenário. Só PSOL e PCdoB se posicionaram contra as alterações. O argumento dos defensores da flexibilização é de que, como estava, a lei nunca funcionaria na prática, considerando que a maioria dos caminhoneiros trabalha bem mais do que a jornada mínima de oito horas. Todo mundo sabe que há uma legião de piratas do asfalto que pilotam cacarecos e sob efeito de drogas pesadas para cumprir prazos de entrega em até 24 horas. Esses indivíduos são simplesmente os protagonistas de uma aventura insana que assassina inocentes nos quatro cantos do país. Apesar desses fatos, os parlamentares parecem estar pensando em outros compromissos. O texto que saiu da Câmara rumo ao Senado prevê que o motorista está autorizado a fazer quatro horas extras por dia e não apenas duas. O descanso diário, que era de nove horas sem interrupção, foi encurtado para oito. A pausa de meia hora, que atualmente é obrigatória a cada quatro horas, agora foi esticada para após seis horas de viagem. Para piorar, os esforços que a polícia rodoviária tem feito para conter os abusos podem voltar à estaca zero. Os agentes não mais poderão mais aplicar multas em trechos de rodovias desprovidas dos locais adequados para pouso. Uma pena, pois até o Ministério dos Transportes estava fazendo um levantamento detalhado dos pontos capazes de desempenhar esse papel. O Ministério Público do Trabalho (MPT) vinha denunciando as razões para a existência de um pacto sinistro entre contratantes que pagam fretes baixíssimos àqueles que topam em nome da sobrevivência. A alternativa de se investir em meios de transporte de carga mais adequados às longas distâncias, leia-se trens e balsas, parece ser uma realidade distante demais para ser considerada. Cinicamente, resta fazer o “pegar ou largar” cotidiano, com todos os riscos de acidentes a si próprios e a terceiros nas costas da triste figura ao volante dos veículos pesados. O resumo da ópera é que, diante da falta de infraestrutura e de fiscalização, existem empresários que preferem manter o atraso em vez de defender o melhor e mais decente do mundo para tocar os seus negócios. Com isso, um ciclo perverso se perpetua e nunca chegamos aonde merecemos chegar. A próxima parada está com os senadores. Carro elétrico à prova d’água Fabricantes de automóveis elétricos estão revelando os seus temores em relação ao mercado brasileiro. A primeira delas está no preço dos modelos, particularmente os europeus, que pode não cabe no bolso de um número de compradores que justificasse a vinda ao país. A segunda está na autonomia dos veículos movidos a baterias carregadas pelas tomadas domésticas, limitada a 200 quilômetros. Com o trânsito caótico das grandes cidades, muitos poderão ter “pane seca” no trajeto de ida ou volta para a residência. Mas a mais prosaica das preocupações está nas constantes inundações das metrópoles, sobretudo as do Sudestes. O risco de motoristas e passageiros levarem choques no interior de seus carros é apontado como um dos limitadores da presença de algumas marcas. Banda larga e lentíssima Aquilo que os usuários de tablets e smartphones já percebem cotidianamente, uma conexão com dificuldades óbvias se comparada a outras vistas no mundo afora, foi mensurado por uma entidade internacional. Na lista de velocidade da banda larga, seja fixa ou móvel, para cada grupo de 100 habitantes, o Brasil ficou em 43º lugar, logo abaixo da China (42º) e da Rússia (37º). Segundo o estudo divulgado esta semana pela União Internacional de Telecomunicações (UIT), a maioria das conexões no mercado brasileiro ainda é de velocidades na faixa de 256 quilobits por segundo (kbps) a 2 megabits por segundo (Mbps). O total de acessos de 2 Mbps a 10 Mbps e acima de 10 Mbps tem desempenho parecido. As empresas de telecomunicações alegam que têm investido em infraestrutura e que a velocidade emperra em razão do perfil demandante do cliente brasileiro, fisurado em voz e imagem. Desastre no setor elétrico Relatório do Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico (Ilumina), uma organização não governamental lideradas por engenheiros, listou uma série de razões para classificar a medida provisória (MP) 579, de 2012, como “a maior barbeiragem” já cometida pelas autoridades do ramo energético. “Numa obsessão por baixar tarifas sem um diagnóstico das razões do aumento, foram 12 passos que levaram ao desastre”, assinala o texto. Entre esses etapas, está o erro de não ter se esperado a data final das concessões para que não houvesse contestações e o uso de uma intervenção no mesmo ano onde terminavam os contratos firmados em 2004. “Não se fez um leilão para substituir os contratos e ainda quebrou-se a Eletrobrás”, sublinhou o documento.

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