Paraíso parafiscal

Sílvio Ribas
Tancredo Neves, um dos maiores sábios da política brasileira, ensinava que “a esperteza, quando é muita, fica grande e come o dono”. Pois é isso o que está ocorrendo com o governo, diante dos frutos amargos colhidos pela sua estratégia intervencionista e “esperta” para a economia. Aquele jeitinho encontrado de se tirar um dinheiro daqui para encaixar no buraco acolá e, assim, pintar as contas federais desequilibradas de azul não conseguiu dobrar analistas domésticos e nem internacionais. O resultado líquido desse uso social da matemática será taxas de juros maiores. Consciente dos pecados de sua gestão, a presidente Dilma Rousseff e os seus principais assessores repetem quase semanalmente mantras como “contratos não serão rasgados”, “regras do jogo serão respeitadas” e “tudo será feito na maior transparência”. Se não tivesse tido uma quebra de confiança tão generalizada, o Executivo não precisaria ficar reiterando que é inocente nas suas operações cotidianas. Pelo menos a mania de colocar a culpa de tudo na especulação financeira e nos boatos de motivação eleitoreira parece ter cessado. A notícia, na última segunda-feira, de que a nota de crédito do Brasil começa a se inclinar para baixo coroa o processo de deterioração alardeado pelo mercado há tempos. Acabou dando aquilo que o governo mais temia: antes das eleições, a agência de rating S&P acrescentou sinal negativo à direita da sua boa avaliação (BBB) do país e de grandes empresas nacionais, tidos ainda como bons pagadores. Mas a relação da dívida federal com o Produto Interno Bruto (PIB) sobe de elevador e o uso parafiscal do BNDES e outros dutos mostrou seu dano maior. Em termos internos, o maior prejuízo gerado pelos malabarismos constantes para falsear a realidade de grandes números econômicos sem fraudá-los escancaradamente está na vigília de observadores. Qualquer coincidência pode ser vista como movimento suspeito. Prova disso foi o resultado surpreendente do PIB no último trimestre de 2013, com alta de 0,7%, evitando a confirmação técnica de uma recessão. Chamou a atenção o número excepcional de compras pela União de caminhões e retroescavadeiras, para distribuir a prefeituras de todo o país. O que parece ser uma medida elogiável também sugeriu ser uma bem calculada injeção de ânimo no indicador de bens de capital, com peso na apuração do PIB. Esse paraíso da criatividade fiscal virou inferno. Fonte: Correio Braziliense de hoje

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