Respire fundo

Silvio Ribas Piorou o trânsito dentro e fora do Plano Piloto, os carros parados em local proibido nos impedem de sair do estacionamento, os sequestros com morte continuam a nos aterrorizar, os cortes de eletricidade fazem parte da rotina, e as empresas estatais e privadas insistem em tratar os clientes como idiotas, sem dar o merecido respeito. A empurroterapia, a incompreensão e o ressentimento generalizados, além de infraestrutura capenga, completam um ambiente social e urbano pouco saudável até mesmo para os corações mais puros. É por essas razões que certa vez cheguei a inventar o bordão "a verdade não leva a nada", esgotado à época com tanta coisa errada em volta provocada só pela falta de bom senso e de civilidade. O reclamão corre o risco de enfartar ou de virar ele próprio um perturbador da ordem, caso acabe liberando a fúria num aleatório dia. Esta semana, por acaso, um frentista jogou gasolina no meu colo logo após a oficina me entregar um carro bichado. Foram instantes para respirar fundo, bem fuuuuuuundo. Ainda bem que sou conhecido como cuca fresca por não esboçar na superfície a minha irritação. Levantar da cama todo santo dia e sair para enfrentar uma série de contrariedades, a maioria bem pequena e digna de ser relevada, é desafio mundial. A velocidade e a bisbilhotice das mídias digitais injetam mais ansiedade nas pessoas ditas normais e tornam coletivas as nossas irritações pessoais, razoáveis ou não. É óbvio que certos sapos não devem ser engolidos e a cidadania nos cobra posição diante de abusos e injustiças. Evidente também é que não podemos nos deixar embarcar nos desatinos. Nossa irritabilidade tem as suas razões de ser, mas acaba transbordando graças a emoções negativas às quais damos excessivo crédito. Chegamos a ter até orgulho de afirmar que não levamos desaforo para casa, mas acabamos contaminando todos os espaços do dia com as queixas de hoje e de ontem. Meditação, acupuntura e contar até 20 antes de falar algo indevido ajudam. O melhor mesmo, contudo, é fazer uma serena confrontação entre a lista de situações irritantes que encaramos toda hora com o quão irritáveis estamos. Nenhum lado pode pesar além da conta, sob risco de outros dramas aflorarem. Fonte: Correio Braziliense - 11/04/2013

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