Crescer é competir

Sílvio Ribas A economista Dilma Vana Rousseff tenta, sem sucesso, há pouco mais de dois anos criar um ambiente favorável ao investimento produtivo, visando a uma expansão sustentável e de longo prazo do Produto Interno Bruto (PIB). Sentada na cadeira deixada por Lula, ela até que encarou sem pestanejar alguns desafios herdados, como o processo de desindustrialização, mas também fechou os olhos para outros tantos obstáculos como o inchaço da máquina pública e a inflação persistente. O maior erro, contudo, foi ter deflagrado uma guinada intervencionista que já compromete a sua própria missão de levar o Brasil a se desenvolver sem sobressaltos. O que seria consagrado como a construção de um Estado indutor do desenvolvimento acabou se resumindo a um organismo candidato a tutor ou protetor dos ramos tidos como estratégicos, sem se preocupar com as conseqüências fiscais de investidas sem fim patrocinadas pelo Tesouro, de centenas de bilhões de reais. Mesmo de posse do diagnóstico correto - o de que o ciclo de crescimento puxado pelo consumo doméstico está esgotado e, portanto, precisa ceder espaço para a busca de mais capacidade e eficiência da oferta local -, a presidente da República optou por mudar o cenário mediante um destrambelhado dirigismo estatal. Em vez de arejar o espaço econômico com menos custos para todos os campos, sem exceção, e oferecer atrativos reais para qualquer empreendimento privado, ela colocou em prática teses dos tempos da ditadura, como a do valor central dado um Estado empresário. Dilma chegou ao Planalto na esteira da popularidade recorde de seu antecessor e principal apoiador e também graças ao salto de 7,5% da economia nacional registrada em 2010, ano da sua eleição. "O pibão foi bão", comentou logo após a divulgação do resultado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em março do ano seguinte. Passados os pibinhos de 2,7% e 0,9% em 2011 e 2012, revelou em dezembro último, com o mesmo sotaque mineiro renascido na campanha eleitoral, o seu pretensioso desejo por um "pibão grandão" este ano. Os esforços e as aspirações sinceras de Dilma não se traduzirão, contudo, em uma expansão econômica anual de 3,5%, um limite de cristalizado em razão do somatório de recentes escolhas equivocadas com os inibidores clássicos, como a infraestrutura saturada, a carga tributária elevada e as legislações ultrapassadas. A ideologia no poder nublou uma verdade inconteste, mostrada por vizinhos como Chile, Colômbia e Peru, a de que crescer é competir. No mundo atual, todos mercados concorrem e buscam a vitória com vantagens relativas e custos menores. A conjuntura externa ainda incerta, a dificuldade crescente em alinhar indicadores domésticos como câmbio e inflação e os efeitos colaterais de medidas de estímulo tomadas ao sabor de urgências, sem a devida ponderação, converteram a auspiciosa agenda da presidente em um conturbado combate cotidiano contra as frustrações em série. Desandou rápido o seu plano de consolidar o disputado mercado consumidor do Brasil enquanto busca proteger e ampliar o parque fabril ameaçado pelas inúmeras contrariedades. A razão disso tudo se resume na perda de confiança, que levou a retomada do crescimento a se apresentar hoje bem mais resistente que a alta de preços. Galinha gorda Insistir em estímulos ao consumo com problemas estruturais para atender a demanda se traduziu apenas em mais comida para o dragão inflacionário. A síndrome do vôo da galinha, analogia feita pelos economistas para descrever a dificuldade da economia nacional sustentar surtos de crescimento por muito tempo, não só se confirmou como está mostrando atraso em novas decolagens da penada. Isso porque a galinha está gorda demais com gastos públicos de custeio para dar um salto. Pelo menos em uma peça fora do lugar o governo teve de mexer, tardiamente. Com uma política fiscal frouxa e o segundo estouro do teto da meta de inflação, o Banco Central (BC) ficou praticamente sem alternativa e teve de subir os juros semana passada. A decisão do Comitê de Politica Monetária (Copom) de elevar a taxa básica (Selic) em 0,25 ponto, para 7,5% veio acompanhado da palavra "cautela" porque a economia mundial não indica uma recuperação importante no curto e médio prazos. O BC demorou demais para reagir à carestia (uma palavra que parecia ficar no passado) ter virado com o personagem tomate piada nacional com repercussão no exterior. A confiança já escassa na praça quase desapareceu de vez. A ata da reunião que será divulgada quinta-feira próxima pode sanar dúvidas sem, entretanto, melhor de vez desequilíbrios deixados por análises incorretas e falhas na comunicação. O ciclo gradativo de aumentos da Selic foi iniciado. O triste é que o combate à inflação e o estímulo à produção iriam requerer medidas mais ousadas, além dos "tiros de metralhadora" sugeridos pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. Mais triste ainda é perceber que o Plano Dilma 1, de reconfigurar a economia, saindo de uma matriz baseada no consumo para outra baseada na competitividade da produção, foi engavetado antes mesmo da chegada à metade da sua gestão presidencial. A agenda eleitoral antecipada agora é "o" Plano Dilma. Apenas em 2015, se for reeleita, é que ela tentará avançar na sua tese. Mas é difícil acreditar que a presidente ou um adversário que a vencer nas urnas consiga governar sem uma repactuação com o setor privado, a exemplo do esforço que Lula fez em 2004. É uma pena quando se sabe que o Brasil precisa retomar velhas reformas esquecidas e urgentemente escolher onde pode e deve ser o mais competitivo do planeta e investir já nas cadeias produtivas e nos recursos humanos envolvidos. Correio Braziliense de 22 de abril de 2013

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