Promessa de Dilma derrotada

Sílvio Ribas A presidente Dilma Rousseff saiu derrotada na sua guerra pessoal contra os bancos, pela derrubada dos elevados juros cobrados do consumidor. A retomada da trajetória de alta da taxa básica (Selic), a partir de abril de 2013, que atingiu na última quarta-feira a marca de 10,5% ao ano após sete altas seguidas, também foi acompanhada de uma ampla recuperação dos níveis médios do spread — a diferença entre a taxa pela qual as instituições tomam dinheiro emprestado e a que cobram dos clientes.
Dados do Banco Central (BC) mostram que, em maio de 2012, quando a presidente ampliou suas investidas para derrubar os juros no varejo, a taxa média do crédito para pessoa física cobrado pelo sistema financeiro era de 37,10% ao ano. Esse indicador despencou a mínima de 25,58% em dezembro daquele ano. Mas voltou a subir e alcançou em novembro último 38,50%, o teto do período. Em pronunciamento em rede nacional de tevê, em 1º de maio de 2012, a presidente disse ser “inadmissível” o Brasil continuar com “um dos juros mais altos do mundo”, num recado direto aos bancos privados, que resistiam em baixar as suas taxas, mesmo após seguidos cortes da Selic. Uma semana após essa cobrança pública de Dilma, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) reagiu à pressão, insinuando que o recuo da taxa básica não chegaria necessariamente ao consumidor. No relatório assinado pelo seu economista-chefe, Rubens Sardenberg, a entidade ressaltou que os cortes na Selic eram algo enquanto durasse a crise na economia mundial. “Você pode levar um cavalo até a beira do rio, mas não conseguirá obrigá-lo a beber água”, afirmou para ilustrar a tese de que, apesar de haver uma condição mais favorável à expansão do crédito, uma ampliação efetiva das operações dependeria da agressividade dos emprestadores e do apetite dos tomadores de crédito. Esse embate começou em abril daquele ano, quando o presidente da Febraban, Murilo Portugal, declarou na saída de uma reunião no Ministério da Fazenda, durante a qual entregou um lista de reivindicações encabeçada pela redução de tributos, que “a bola” da derrubada dos spreads estava com o governo. No mês seguinte, a presidente devolveria a bola aos bancos. Perna manca O fato é que o quadro atual jogou uma pá de cal sobre a cruzada de Dilma, item central de seu plano para mudar a matriz econômica do país. Com a taxa básica de juros menor, o governo queria estimular o consumo via crédito ao baratear os seus custos e, assim, estimular a atividade econômica. No apagar das luzes de 2013, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que a economia tinha na falta de crédito uma “perna manca”, ignorando os fatores que levaram a este defeito. Para o professor de economia da PUC-SP Antonio Corrêa Lacerda, a resistência da inflação forçou o BC a agir. Mas a escalada de juros para conter os preços veio mesmo da série de erros cometidos pelo governo nos últimos dois anos. “Em 2012, os artifícios contábeis para fechar a meta de superavit primário minaram a confiança e fragilizaram estimativas dos índices de preços. Ano passado, o discurso oficial não foi coeso o suficiente para respaldar as metas”, analisou. Assim, só em 2015, com a posse de novo governo ou início do segundo mandato de Dilma, será possível “ancorar expectativas” e voltar a perseguir juros reais de 1,5% a 2% ao ano. Jason Vieira, diretor-geral do Portal de Informações Financeiras Moneyou, não tem mais dúvidas de que a batalha dos juros baixos no Brasil é uma promessa vencida. “Falta muito pouco para a presidente apresentar a mesma Selic que herdou do antecessor. Isso deixa evidente de que o país não criou as condições para conviver com taxas moderadas ou civilizadas, como dizia Dilma”, comentou. Na sua opinião, faltam mudanças estruturais para isso, como dotar a economia de infraestrutura adequada, aliviar a carga tributária e desatrelar diferentes preços de índices de reajuste. O condicionamento das decisões do BC à orientação do Planalto também contribuiu para tornar o controle de preços um mal ainda mais difícil de lidar. “A inflação foi provocada pela demanda aquecida, com renda puxada por indexadores, E derrubar os juros na canetada não é a melhor saída”, concluiu. Reajuste de tabelas Conforme o BC, até mesmo os bancos estatais, usados como alavanca para forçar o recuo dos spreads, foram levados nos últimos meses a elevar os percentuais cobrados nos seus empréstimos. A taxa de juros do cheque especial da Caixa Econômica Federal, por exemplo, era de 62,49% ao ano em maio de 2012. Agora está em 67,96%. Na mesma comparação para essa modalidade, também estão em patamares maiores Santander (230,16%) e HSBC (209,92%). O Santander explicou que a sua tarifa do cheque especial “ é adequada às condições diferenciadas do produto, o único que oferece aos clientes 10 dias sem juros”. “Os clientes ainda podem parcelar o saldo devedor por metade da taxa”, acrescentou. “O banco avalia constantemente as condições do mercado para oferecer aos clientes a melhor relação entre custo e benefício em seus produtos e serviços”, observou em nota. No financiamento de veículos, o Banco do Brasil (BB) cobrava 16,97% à época e chegou a 20,06% no começo deste mês. Também cobram hoje mais caro para esse produto financeiro Santander (21,06%) e Bradesco (20,59%). Em nota, o BB declarou que “avalia permanentemente os fundamentos do mercado para estabelecer a política de preços de seus produtos, e mantêm o compromisso de oferecer taxas de juros que estejam entre as menores do sistema financeiro”. No financiamento de bens de consumo, só as taxas anuais de HSBC e Bradesco superam às suas próprias tabelas de maio de 2012, respectivamente com 100,41% e 41,61%. Em nota, o Itaú ressaltou que as variações nas taxas têm como pano de fundo a política monetária. “As alterações na Selic têm implicações diretas nos custos de captação da instituição e isso influencia também as taxas cobradas. O movimento de elevação da taxa básica é uma ferramenta de combate à inflação e de controle do crédito, portanto é esperado que as taxas dos bancos se elevem após um aumento da Selic. Caso contrário, não surtiriam os efeitos desejados pela política monetária”, afirmou. Fonte: Correio Braziliense de hoje

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