Cohabitation à brasileira

Por Sílvio Ribas Uma eventual nomeação de Henrique Meirelles como ministro da Fazenda do segundo mandato de Dilma Rousseff (2015-2018) seria a opção consciente da presidente por viver uma situação semelhante à encarada por François Miterrand em 1986. Em virtude de um sistema presidencialista atípico, no qual o Parlamento também se faz presente no Executivo, o líder histórico da esquerda francesa foi obrigado a conviver em seu governo com um jovem primeiro-ministro de centro-direita, Jacques Chirac, fruto da maioria congressual. Além de não contar com a simpatia de Dilma, Meirelles representa tudo o que ela sempre negou em termos de política econômica. No Brasil, o fenômeno batizado pelo ex-premiê francês Raymond Barre de cohabitation (coabitação) se repetiria por caminhos tortos e com certa dose de esquizofrenia. A presidente de pensamento desenvolvimentista, discípula número um da professora Maria da Conceição Tavares, cumpriu até agora o efetivo papel de comandante da economia, deixando na Fazenda alguém sintonizado com seu ideário e 100% obediente às suas diretrizes. A "opção Meirelles" implicaria em engolir o que a senadora petista Marta Suplicy chamou de "equipe independente", capitaneada por um virtual "primeiro ministro". São fortes as pressões que recaem sobre Dilma desde o anúncio do resultado do segundo turno. A maior delas vem dos próprios líderes de seu partido, o PT, para que a candidata reeleita dê sinais claros e firmes de mudança substantiva em sua fracassada gestão econômica, em favor do resgate da confiança de empresários e de investidores no mercado financeiro. Esses sinais se resumiriam numa só medida: a definição do sucessor do ministro Guido Mantega. Mas essa deverá ser a decisão mais difícil que ela já tomou, implicando no desfecho do dilema hamletiano de "ser ou não ser" a czarina da economia. Especulações O rançoso mistério em torno de quem seria o escolhido para o lugar de Mantega vem fomentando especulações as mais variadas. Basta uma mexida na agenda oficial do Planalto ou um aceno de bastidores para a bolsa de apostas oscilar, com reflexos imediatos no mercado. A breve passagem pela lista de ministeriáveis de nomes de executivos de reconhecido sucesso no meio empresarial, por exemplo, só desperdiçou tempo e o escasso capital político da presidente, sem lua de mel com as urnas. O saldo líquido é só o reforço à indagação geral: Dilma vai mudar algo ou fará "mais do mesmo". Todo o vaivém do processo de escolha do novo chefe da equipe econômica se restringiu à impressão de que tudo está dependente de uma conversa de Dilma consigo mesma. Um indicativo disso está em suas entrevistas recentes, quando ironizou os lances descritos pela imprensa na montagem do novo ministério, os rotulando de "criatividade fértil de Brasília". E o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva? O próprio faz questão de se atribuir a imagem de "figura mais influente" na nova gestão e de cobrar um "sim" a Meirelles. Mas nem essa marola vendida como tsunami pode ser verdadeira. Para completar, se a presidente aceitar ir atrás do ex-presidente do Banco Central (BC), ele ainda tem a chance de declinar. Sobraria na lista o nome de Nelson Barbosa, ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda. Fonte: Correio Econômico de hoje/Correio Braziliense

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