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Sílvio Ribas
Véi, o bicho tá pegando! Esse breve enunciado, no linguajar próprio dos adolescentes, serve muito bem para retratar os estragos causados pela desconfiança dos mercados financeiros com a economia brasileira. Mais ainda: é o quadro mais resumido para descrever as revoltas populares que estampam as manchetes da mídia nacional desde a semana passada. Ninguém mais duvida de que o país está intoleravelmente caro, corrupto e inseguro. A percepção de que saúde e educação estão perdendo terreno nos orçamentos dos governos nos três níveis para os malfeitos, os mal planejados e os bem desperdiçados rompeu o cordão de isolamento das conversas privadas, presenciais ou não, para bagunçar tremendamente o cotidiano urbano. A voz das ruas deixou claro que as insatisfações com a má qualidade dos serviços essenciais e os desvios com os suados recursos públicos, extraídos das costas da população, passaram já faz um bom tempo do nível suportável. O monstro está solto, a velha política está contra a parede e os sociológos tentam interpretar os fatos à luz dos conceitos clássicos e das inferências modernas. O que me surpreendeu não foi o tamanho assombroso das manifestações em grandes cidades, uma massa pacífica de centenas de milhares de cidadãos com uns indesejáveis radicais livres no meio. Fiquei boquiaberto com o falta de preparo do Estado em lidar com essas situações, próprias de qualquer democracia evoluída. No começo, com excessos e violência na repressão. Depois, um recuo nada tático das forças policiais, deixando os próprios manifestantes à mercê do crime. O movimento sem partidos políticos à frente ou atrás, multifacetado na forma e no conteúdo, repete o fenômeno social visto em outras primaveras recentes, como as do norte da África e da Turquia, movido à interatividade digital. Não chegaremos a toques de recolher ou a uma guerra civil, mas podemos chegar a um lugar melhor tão logo a contestação ganhe menos e mais consolidadas bandeiras. Seria bom repetir que o sistema de representação política está agonizando com a institucionalização do conchavo e do patrimonialismo. Uma República presidida por ex-militante estudantil, que sofreu como poucos nas mãos pesadas da repressão política, assessorada por muitos perseguidos nos anos de chumbo, deveria responder melhor aos anseios dos eleitores. Caiu também o pano da ideia geral de que os jovens não ligam para nada. Fonte: Correio Braziliense de hoje

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