Indústria: inovação ou morte

Sílvio Ribas A indústria brasileira precisa investir em inovação. Repetida há anos como mantra por empresários, cientistas e autoridades, essa falsa unanimidade já deixou de ser uma opção. Agora como carma, inovar se tornou questão de sobrevivência em meio à concorrência global e uma chance de recuperar a competitividade perdida nos últimos anos. Muito além das promessas vindas da exploração do pré-sal e do orgulho com a safra recorde de grãos, empregos melhores e estabilidade econômica duradoura vão depender, cada vez mais, da capacidade de o país transferir conhecimento próprio à produção. O principal alerta para isso vem da balança comercial, que acumulou, de janeiro a abril deste ano, um deficit de US$ 6,2 bilhões, acenando o risco de fechar o ano no vermelho pela primeira vez desde 2000. Uma perspectiva de queda nos preços internacionais de alimentos e de minérios deixa o cenário ainda mais desafiador em favor da inovação. Apesar de figurar entre os 15 maiores polos geradores de novidades científicas, com cerca de 400 incubadoras, 5 mil empreendimentos parceiros e 20 parques tecnológicos, o país ocupa uma posição mediana no ranking da inventividade. O descompasso está no medo de inovar. "A inovação deveria virar uma onda, alcançando todos os ramos empresariais. Há até recursos à disposição para essa generalização, mas a maioria das empresas pouco ou nada inova, preferindo proteção em vez de competir", avalia Mariano Francisco Laplane, presidente do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE). Ele prevê uma "tragédia econômica" se o capital nacional não responder à demanda mundial, sobretudo onde já se destaca, como energias renováveis. "Os Estados Unidos conseguiram trilhar uma retomada industrial após encararem o desafio de explorar gás de xisto", ilustra. Chance desperdiçada O Brasil vem perdendo bilhetes de loteria ao longo da história ao desprezar a oportunidade de levar descobertas e inventos nacionais às linhas de montagem, conquistando assim mercados. A maior prova disso é o fato de os irmãos norte-americanos Orville e Wilbur Wright serem considerados pioneiros da aviação em seu país, apesar de terem voado em um planador, em 1903, enquanto Alberto Santos Dumont já tinha contornado a Torre Eiffel com um dirigível, em 1901 — e com o 14-Bis, em 1906. A diferença é que o brasileiro não patenteou o avião e outras tantas invenções, sem ainda encontrar na terra natal chance para produzi-las em escala. "O país tem tradição empreendedora e inovadora pouco aproveitada", explica Nixon Diniz Pereira, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e biógrafo de Santos Dumont. Curiosamente, ele lembra que a preocupação do Estado em proteger direitos de criações industriais remonta ao tempo do Império, com a fundação de um órgão para essa finalidade na década de 1870. Naquela época, inúmeros produtos foram patenteados, muitos então considerados excêntricos, como um carro-casa, um chuveiro portátil e um traje flutuante para banhistas. A iniciativa foi insuficiente para reter talentos como os do pai da aviação e do rádio, Roberto Landell de Moura, que tiveram de buscar reconhecimento no exterior. Outros que ficaram, como o médico Vital Brazil, criador de soros, mereciam mais. "Já pensou se multinacionais como Boeing (aeronáutica), Bayer (farmacêutica) e Nokia (telecomunicações) tivessem surgido no Brasil?", filosofa. Para o professor, o governo deveria incentivar o ensino voltado para a gestão de negócios, como fazem países asiáticos, onde alunos aprendem a conviver desde cedo com o mercado. "Precisamos de inventores empreendedores", resume. O governo anunciou, em março, pacote de R$ 32,9 bilhões para a inovação, com duração de dois anos. Apesar do volume recorde de recursos, especialistas lamentam o fato de o Inova Empresa não ter sido acompanhado de uma ampla reforma do modelo brasileiro de incentivo à inovação. (Colaborou Juliana Borre) Fonte: Correio Braziliense de hoje

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