Meu laboratório de quintal
Sílvio Ribas
As maiores empresas do mundo de hoje nasceram em garagens apertadas, dormitórios estudantis desorganizados e laboratórios universitários de fundos de corredor. Essas gigantes tecnológicas deram os primeiros passos de forma improvisada, guiadas só pelo sonho de jovens empreendedores.
Bem antes dessas histórias de sucesso global, havia também pequenos universos de invenção, onde a imaginação infantil transformava qualquer canto num centro de descobertas. O meu ficava no barracão do quintal de casa, lá na pequena Curvelo (MG) daqueles distantes anos 1970 e 1980.
Entre latas de tinta vazias, ferramentas encostadas e cheiro de terra molhada, ali montei “o laboratório”. Sozinho ou com amigos, passava tardes absorto em experiências que misturavam curiosidade e boa dose de improviso. O início dessa aventura foi o kit “Jovem Cientista”, da Estrela.
Esse foi o presente inesquecível que ganhei de Natal da querida Cybelle Torres, minha prima engenheira química com carreira na Usiminas. A cientista de verdade me abriu as portas do maravilhoso mundo das ciências. Nele, sonhava fazer minha cidade um lugar de grandes avanços.
Quando desembrulhei o pacote, explodi de alegria. O estojo de isopor do meu kit de química estava recheado de tubos de ensaio, pipetas, microscópio e frascos com permanganato de potássio, cloreto de sódio, corantes e outros componentes. Tudo era real e prático, tudo orientado por manual.
Com jaleco branco, tocava experimentos simples e seguros, quase todos baseados na adição de água. Mas a gente sempre dava jeito de ir além das atividades sugeridas. Lembro de ter observado fio de cabelo ampliado, pata de formiga, pedaços de folhas e outras maravilhas invisíveis a olho nu.
Uma vez, uma gota de ácido me rendeu discreta e redonda cicatriz na mão esquerda, que carrego até hoje como medalha de honra. Congelávamos e queimávamos diferentes materiais, investigávamos animais e usávamos lentes para verter luz do sol em raios laser. Bombinhas viravam foguetes.
O barracão se tornava um verdadeiro santuário da curiosidade infantil. A física, a química e a biologia me fascinavam, mas a vida me levou para o mundo das palavras. Ainda assim, aquele kit me despertou a essencial vontade de perguntar e descobrir. Obrigado, Cybelle, por me colocar nessa larga avenida.
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