A diplomacia do fino licor

Sílvio Ribas

Desde que deixei Curvelo (MG) para desbravar o mundo, levo como cartão de visitas um verdadeiro emblema de nossa terra: o fino e renomado licor de pequi. Foi com o inesquecível prefeito Paulo Dayrell que aprendi o gesto diplomático de presentear amigos e colegas de trabalho com o Cristal Brasil – um ato capaz de aproximar corações, abrir portas e iluminar sorrisos, enquanto exalta nossas raízes a cada brinde.

Oferecer algo genuíno de nossa cultura é a essência da hospitalidade mineira. E, com o Cristal Brasil, alcançamos um degrau mais alto: encantar os cinco sentidos. Do aroma doce, que lembra a “bala delícia”, como descreveu com carinho uma amiga paulistana, ao tilintar das tacinhas em encontros profissionais e familiares, cada golinho sela amizades e nos faz viajar às origens.

Durante anos, autoridades e empresários de Curvelo escolheram essas garrafas sinuosas – que, para mim, remetem à icônica Jeannie dos velhos tempos da TV – como souvenir oficial, um mimo para nobres. Ao cultivar esse costume nas capitais por onde passei – BH, Floripa, Sampa e Brasília – reguei conversas saborosas e espalhei uma marca de sabor e história de nossa gente.

Eu costumava brincar, dizendo que o Cristal Brasil era tão raro e especial que merecia ser degustado com um dedal, não só pela sua nobreza, mas também pelo seu elevado teor calórico e alcoólico. Recordo-me de uma ocasião em que alguns, ignorando meu conselho, se deixaram levar pelo encanto do licor de forma desregrada. Quantas risadas soltas!

Ao longo dos anos, mantive amostras desse tesouro em casa, sempre pronto para ser compartilhado. Em 1991, durante um breve intervalo na gravação do programa Jô Soares 11 e Meia, no SBT, aproveitei o momento em que o apresentador se aproximava da câmera para, discretamente, entregar-lhe uma garrafa do Cristal Brasil. Junto ao presente embrulhado com todo cuidado deixei também cópias de reportagens que celebravam a fama do licor. 

Eu estava na plateia com meus colegas de Jornalismo da PUC Minas, e, embora o nosso eterno “gordo” não tenha dado andamento à pauta com o dono da marca, José Palhares, sempre imaginei que uma entrevista com ele renderia entrevista memorável. Assim como o rei do futebol Pelé, nosso licor de cristal tinha o poder de arejar ambientes, sejam eles tensos ou relaxados.

Em 1984, o Estado de Minas destacou, na cobertura da visita do presidente francês François Mitterrand ao governador Hélio Garcia, um episódio que até hoje enche os curvelanos de orgulho. Durante o almoço oficial no Palácio da Liberdade, Mitterrand, representante de uma nação célebre por suas bebidas sofisticadas, encantou-se com o licor curvelano. Tão impressionado com seu sabor singular, o presidente mandou que duas caixas fossem incluídas na bagagem de sua comitiva.

O pequi, ícone da rica diversidade cultural e gastronômica de Minas, segue lado a lado com nossas cachaças e queijos, compondo o legado de um município que celebra 150 anos de fundação neste 2025. Hoje, sob novo formato de envase, mas igual conteúdo, o licor não é só uma celebração do passado, mas um lembre da magia deste município.

Em 1996, uma reportagem que realizei para a Gazeta Mercantil mergulhou na história do Cristal Brasil. Nela, José Palhares revelava seus sonhos de expandir as vendas pelo Mercosul, lembrando que a receita do licor remontava à primeira década do século XX – um item sem igual, tanto em qualidade quanto em sabor. Produto carrega origem e a tradição: as águas cristalinas das nascentes de Minas, a rica flora nativa e uma técnica aperfeiçoada com a calma e a sabedoria. 

Do amarelado pequi – o ouro do sertão mineiro e goiano – extraiu-se um néctar que conquistou até os que, inicialmente, hesitavam diante de seu sabor incomum. Concebido por Ricardo de Oliveira Penna, renomado farmacêutico da região, e produzido com o zelo de Zezito Palhares, a fábrica operou com excelência até 2008, quando a produção passou a ser realizada na fazenda Cristal Brasil, em Capim Branco (MG).


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