Copacabana em chamas

Sílvio Ribas Os confrontos violentos entre comunidades de baixa renda e forças policiais se tornaram rotina de norte a sul. Neste país conflagrado, com estatísticas de assassinatos superiores aos de territórios em guerra, como Afeganistão e Iraque, vias bloqueadas com entulhos e pneus incandescentes se tornaram notícia cotidiana, sobretudo nas grandes cidades, como mais um simples transtorno no trânsito. Ônibus esturricados pela ação de vândalos também não é de hoje um arroz de festa na mídia. Para completar o cotidiano caos urbano, chegam ainda às ruas um crescente varejo da sordidez brasileira, com infanticídio, corpos esquartejados e execuções à bala de transeuntes inocentes. A sociedade até se choca, se comove, apela por Justiça, se une em gestos de solidariedade às vítimas, mas termina no fim do dia pedindo aos céus proteção para os entes queridos contra os ataques do vandalismo, contra as tocaias de bandidos e contra psicopatas que cruzam anônimos à nossa frentes. Esse quadro de desordem gera ansiedade incomum nas pessoas e avança com desenvoltura a ponto de consolidar no imaginário doméstico e internacional a percepção do nosso amistoso povo como gente sem paz e sem comando. Nada mais inconveniente à atração de turistas gringos de última hora para a Copa do Mundo do que correrem pelo mundo as imagens desta semana de Copacabana ― o bairro brasileiro mais famoso lá fora ― sitiada pelo quebra-pau e pelas chamas. É duplamente preocupante ver que a confiança da população no Estado como agente protetor se evapora rapidamente, pois isso só robustece o crime e a anarquia. Sem fé nos governos, a selva toma o lugar da civilização e fixa as regras balizadas pelo poder de fogo de cada um. O sofrimento e a apreensão permanente das famílias em zonas de conflito explícito, como favelas e periferias, transbordaram os limites territoriais e esgarçam vazios de autoridade. Para alguns, o problema todo está no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) por deixar inimputáveis menores de 18 anos dos seus crimes hediondos. Para outros, o drama está no inchaço populacional das metrópoles sem infraestrutura. E há ainda os que explicam a violência geral pela erosão dos valores morais, como o respeito à vida humana. De certa forma, todos os argumentos sobre a insegurança reinante têm lá sua razão e é preciso que sejam amplamente discutidos nas campanhas eleitorais. Fonte: Correio Braziliense de 24 de abril de 2014

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