Culpa de São Pedro

A natureza não se defende. Ela se vinga. Era com essa expressão que o saudoso jornalista Joelmir Beting se referia às catástrofes naturais, cada vez mais frequentes no noticiário em razão da loucura do clima. No começo de mais uma temporada de chuvas torrenciais sobre as maiores regiões metropolitanas do país, sempre acompanhadas de tragédias previamente anunciadas, ouso colar outra máxima à proferida pelo mestre do comentário econômico na tevê: Quem quer faz. Quem não quer, arruma logo uma desculpa. Estamos completando três décadas nas quais São Pedro parece figurar como o inimigo número um das moradias pobres em áreas de risco, dos pequenos agricultores sem seguro no banco, da mobilidade urbana limitada e das medidas em favor do progresso sustentável. A diferença é que, graças a uma maior consciência ecológica, desculpas esfarrapadas das autoridades, como a de que a estiagem prolongada foi além do previsto ou de que o índice pluviométrico estimado para certo mês resolveu aparecer todo num só dia, não colam mais com facilidade. Os mortos pelas trombas d"água e das enxurradas poderiam até estar vivas se medidas preventivas e, sobretudo, investimentos pesados em infraestrutura tivessem ocorrido no período correto. Mas o que já morreu faz tempo e não dá sinais de que vai ressuscitar é o senso de obrigatoriedade de quem prometeu e promete ao contribuinte uma solução permanente para as ameaças que surgem no horizonte nas formas de nuvens carregadas no verão ou de uma aridez sem dó e piedade no inverno. Se as grandes cidades abrigam a maior parte da população brasileira, o excesso ou a falta de água nessas áreas precisa ser domado como uma prioridade zero da administração dos três níveis, mesmo que isso leve décadas para ser concretizado. Desapropriações, canalizações e aberturas de buracos no solo para captar ou para escoar recursos hídricos têm de estar no orçamento público. Trata-se de metas para as quais toda a sociedade, sem distinção de nível social e de renda, deve estar vigilante, cobrando ações brandidas no auge de cada crise climática, esquecidas logo depois, na fase de tempo bom. E isso se refere não só às situações de caos urbano deste gigante tropical. Obras para ajustar a economia do país à crescente incerteza meteorológica também são para ontem. Um bom exemplo é o acionamento de usinas térmicas para compensar os tais "regimes hidrológicos" ruins que se abastem sobre hidrelétricas, sempre creditados à má vontade de São Pedro. O santo postado na porta do Paraíso também continua levando a pecha para atrasos na entrega de estádios de futebol da Copa, da falta de pintura nas faixas do asfalto novo, da estrada na selva amazônica que nunca fica pronta e para os engarrafamentos nossos de todo o dia. Pobre São Pedro. Os pecados da omissão e da falta de planejamento do Estado estão longe de serem redimidos pela fé no futuro grandioso do país. Os flagelados querem mais respeito e os cargos públicos requerem mais compromissos dos seus eventuais ocupantes. Virada chinesa Uma das notícias mais intrigantes da semana passada e que deveria abrir os olhos de analistas econômicos que teimam em não ver a revolução em curso no mundo está na posição alcançada pela China em 2012, como líder em pedidos de registro de patentes industriais no mundo. De paraíso da pirataria a potência inovadora, a segunda maior economia do mundo dá mostras que está mesmo mudando seu perfil com vistas a um papel estratégico mais expressivo e duradouro no futuro próximo. Segundo a Organização Mundial de Propriedade Intelectual, os chineses pediram ano passado o registro de 560 mil patentes pelo mundo, número três vezes maior ao dos Estados Unidos no mesmo período. Os EUA são os maiores detentores desses registros, com 2,2 milhões de patentes acumuladas. Em segundo lugar vem o Japão, com 1,7 milhão. A China já está em terceiro, com 900 mil. O Brasil está em 28º lugar. Fonte: Correio Braziliense, de 16 de dezembro de 2013

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