Brasília, perto dos 50 anos


Imprudência que decolou
André Aranha Corrêa do Lago*

Não se pode negar: Brasília é a maior contribuição brasileira à arte do século 20. Apesar de um século de considerável produção cultural - com grandes momentos na nossa arte contemporânea, o Cinema Novo e, sobretudo, a Bossa Nova - acredito que em nenhuma outra expressão artística o Brasil terá atingido internacionalmente o patamar de respeito, aceitação e influência que conseguiu nossa arquitetura, principalmente graças a Brasília. Nossa capital já foi amplamente discutida e continua a provocar, com 50 anos, os mais variados debates e opiniões; por isso procurarei concentrar-me no que me parece mais relevante: o fato de Brasília ser a realização mais completa de uma utopia que ocupou algumas das mentes mais favorecidas do século passado e, também, o de ser o símbolo mais inequívoco de que somos capazes de inserir-nos no main stream da arte ocidental. (...) Quando o governo de Juscelino Kubitschek lança o concurso nacional para o Plano Piloto de Brasília, em 1956, a vanguarda da arquitetura internacional já não sonhava com a realização da cidade revolucionária. Mas não porque a ideia havia falhado e sim porque sua realização, pelo menos na Europa e nos EUA, se havia revelado impossível. Chandigarh, o que havia de mais próximo do sonho de uma geração de arquitetos até aquele momento, era criticada em todas as frentes: para alguns, era a imposição de conceitos ocidentais discutíveis a uma sociedade não ocidental; para outros, eram conceitos extraordinários executados por uma sociedade discutível. (...) Brasília é o primeiro conjunto arquitetônico moderno a ser colocado na lista do Patrimônio da Humanidade da Unesco. Isso deve nos recordar que nossa capital é uma cidade de concepção moderna, mas não contemporânea. É um conjunto arquitetônico do passado - apesar de recente - e deve ser tratado como tal. Brasília, se forem respeitados os princípios que orientaram sua criação, deverá ser, cada vez mais, para o Brasil e para o mundo, o símbolo de uma época. Como disse Mário Pedrosa, "se Brasília foi uma imprudência, viva a imprudência." (...) (26 de dezembro de 2009)

*Diplomata, crítico de arquitetura e autor de publicações sobre o tema.

Comentários