Solução de mobilidade


Sílvio Ribas

Uma das questões mais comentadas no momento, sobretudo nas maiores cidades, trata da legalidade dos serviços prestados no país pela empresa norte-americana de tecnologia Uber. O aplicativo (app) que conecta motoristas autônomos e usuários interessados em uma alternativa de transporte individual despertou reações extremadas do público, seja de apoio à iniciativa ou, infelizmente, de repúdio, incluindo transtornos no trânsito a profissionais e até mesmo a passageiros.
Diante desse tema que ganhou rapidamente as ruas e do impasse em torno da suposta clandestinidade de algo que é fruto da revolução digital em curso, parlamentares e governantes do país têm sido chamados a dar resposta legal, para pôr fim às dúvidas.
Não há mesmo como lutar contra o inevitável, contra a evolução de serviços e de negócios movida pelas mudanças dos padrões tecnológicos e pelos novos costumes da sociedade. O papel do legislador é criar o ambiente jurídico ideal para o livre desempenho das atividades econômicas, respeitando direitos e garantias individuais e coletivas.
Enquanto câmaras de vereadores e assembleias legislativas dos estados aprovam as primeiras iniciativas na direção de regulamentar ou, sobretudo, proibir a atuação do Uber, cabe ao Congresso dar uma solução de desenho nacional, que pacifique a questão em caráter amplo e definitivo.
Foi com esse espírito que o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) apresentou no último dia 12 um projeto de lei para reconhecer o serviço como legítimo, além de estabelecer os limites em torno dos quais poderá ser oferecido. Mesmo que alguns possam enxergar constitucionalidade no Uber, acredito que o PLS 530, de 2015, vai garantir seus serviços sem mais transtornos ou questionamentos, além de preencher eventuais lacunas legais.
O foco principal da proposta está no respeito ao direito de escolha do cidadão, consagrado pelo Código de Defesa do Consumidor, que acaba de completar 25 anos. Ela também busca preservar as alternativas de serviços, em reforço da livre iniciativa, princípio expresso no primeiro artigo da Constituição, inciso quarto, como fundamento da República.
A livre iniciativa e a liberdade profissional estão asseguradas no texto constitucional e cuja defesa vem desde os tempos da Revolução Francesa, quando foram evocadas para abolir privilégios e corporativismos.
Além dos princípios que evoco para fazer essa proposição ao Senado, a regulamentação do serviço de compartilhamento de veículos por redes digitais servirá para o aperfeiçoamento dos serviços de transporte em geral.
As atividades dos taxistas, por exemplo, podem e devem ganhar com a convivência de novos atores, como Uber e outros do gênero que vierem a surgir. Identificados como principais focos de resistência à novidade, os motoristas de táxi seriam beneficiados à medida que velhas distorções em sua atividade sejam corrigidas e novos padrões de excelência sejam incorporados. Mais o maior beneficiado com a inovação será mesmo o consumidor.
Outro efeito colateral positivo a ser promovido pelo surgimento de uma nova alternativa de transporte está no reforço ao enfrentamento dos crescentes problemas de mobilidade. A população que sofre com as condições precárias de transporte público só tem a ganhar com a ampliação das opções.
O Uber se encaixa como complemento às formas conhecidas de deslocamento nas cidades. O direito da mobilidade, diga-se de passagem, foi confirmado por essa casa como um direito social fundamental.
Pois bem, o Congresso precisa instituir uma regra nacional para autorizar o serviço, aperfeiçoar o sistema de transportes em geral e oferecer uma solução de mobilidade em meio ao caos do trânsito, do transporte público deficiente e ao excesso de carros nas ruas. Não regulamentar esse serviço é contrariar o desenvolvimento tecnológico, o empreendedorismo e o direito de escolha do cidadão.
O projeto de Ferraço estabelece que o motorista do Uber não é transportador comum nem presta serviços de transporte público de passageiros. Mas, como microeempreendedor, deve obedecer uma série de obrigações legais.
Ele propôs, por exemplo, que os motoristas não deverão solicitar ou embarcar usuários diretamente nas vias públicas sem que estes tenham requisitado previamente o compartilhamento. Os prestadores do serviço não podem incorrer em qualquer discriminação e devem seguir todos os preceitos legais relacionados à acessibilidade.
Sobre o valor do serviço de compartilhamento incidirá o Imposto Sobre Serviços (ISS), seguindo os parâmetros aplicados aos serviços de táxi. A operação do provedor será precedida de registro no órgão municipal competente para fiscalização de trânsito e transporte, observando requisitos em lei municipal.
Pelo projeto, os municípios fixarão taxa de licença anual igual ou superior aos serviços de táxi a ser revertida em obras, investimentos e programas de melhorias do transporte público. A realização do compartilhamento do transporte individual privado está condicionada ao uso de automóveis que estejam em dia com inspeções e exigências legais.
O projeto abarca mais de uma dezena de quesitos que devem ser observados e que dão igualdade de competição entre serviços distintos e mais segurança à sociedade. Vamos ao debate.

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