Reflexões outonais
Sílvio Ribas
No dia em que escrevo este texto, 11
de outubro de 2025, um sábado, constato ter vivido 20.387 dias — o equivalente
a 489.288 horas, 29.357.280 minutos ou 1.761.436.800 segundos.
Tantos instantes, somados e diluídos em quase 56 anos, compõem uma existência em plena curva de maturação, num ponto em que o tempo já não se mede só pelo que se vive, mas pelo que ainda se pode fazer valer.
Ao dividir a vida em três etapas de aproximadamente 27 anos — número que, não por acaso, marcou a partida precoce de tantos ídolos — percebo-me adentrando o último terço da jornada.
É o território dos “finalmentes”, como diria um poeta mineiro, mas ainda fértil para semear novos sonhos e projetos. O ideal teria sido colher em abundância o que se plantou nas fases anteriores, mas o outono, ainda que tardio, também é tempo de colheita.
A diferença é que o fruto já vem acompanhado de reflexão e moderação, e o prazer de saboreá-lo se mistura à consciência de que as estações não são infinitas.
Se fosse possível converter a biografia em estações do ano, eu estaria agora sentado à varanda, assistindo à metade do meu outono pessoal. É quando as folhas começam a cair, os hormônios desaceleram e a gravidade parece pesar mais sobre os ossos.
Mas é também o momento em que a alma, menos apressada, aprende a apreciar o que floresce devagar. Há contramedidas para conter as curvas descendentes, e a ciência nos oferece alentos para prolongar ofícios e prazeres. A natureza, afinal, não nos ensina a deter o tempo, mas a conviver com ele.
Pertencente a uma geração que atravessou transformações tecnológicas, políticas e sociais de amplitude inédita — do mundo inteiramente analógico aos primeiros computadores pessoais e à era da inteligência artificial —, trago comigo um ponto de vista inter-geracional privilegiado.
Testemunhei revoluções, vi impérios ruírem, assisti à ascensão da comunicação instantânea e à erosão das distâncias. O passado, hoje, cabe na palma da mão; e, ainda assim, o essencial continua sendo olhar nos olhos e respirar o instante.
Por curiosidade, calculei que, com base na média de 72 batimentos por minuto, meu coração já pulsou umas 2.113.724.160 vezes desde as 6h da manhã de 16 de dezembro de 1969.
E é curioso pensar que cada uma dessas batidas, invisível e insistente, é uma pequena prova de resistência. Enquanto houver mais uma, ainda haverá motivo para escrever, plantar e esperar — mesmo que o inverno se avizinhe.

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