A velha estação e seus presidentes
Em só duas ocasiões, ambas devotadas aos trilhos, Curvelo recepcionou a maior autoridade do país. Separados por quase um século, os presidentes Rodrigues Alves e Fernando Henrique Cardoso (FHC) honraram a cidade mineira com as suas presenças. O primeiro veio para pré-inaugurar a velha estação ferroviária, em 1904, e o outro, para aposentá-la de vez, em 1997.
Foram nos 93 anos que separam as breves visitas presidenciais que aquele município sertanejo encenou o vai-e-vem de pessoas, mercadorias e sonhos pela via férrea. Embarcados na mesma locomotiva histórica, os chefes do Executivo prometeram ao povo dias melhores para o Brasil. Depois deles, a retirada dos trilhos da zona urbana moldou paisagens e negócios.
Em 3 de julho de 1997, FHC desfilou de trem por oito quilômetros para inaugurar o novo trecho da linha e a nova estação. Moradores emocionados lançaram flores sobre a composição. Em discurso, o presidente recordou que a remoção da linha do centro da cidade era anseio de mais de duas décadas, concretizado graças à parceria entre Exército e iniciativa privada.
Os trilhos de Curvelo passaram por diferentes fases: Estrada de Ferro Central do Brasil (1905–1975), Rede Ferroviária Federal S.A. (1975–1996) e Ferrovia Centro-Atlântica, desde 1997. A cidade segue na malha ferroviária, embora tenha se despedido dos trens de passageiros nos anos 1990. Centro cultural, a velha estação virou guardiã da memória e do orgulho.
O início de tudo remonta ao fim do século 19, quando os trilhos chegaram e transformaram Curvelo em entreposto comercial de vasta região do norte do estado. A cidade prosperou com o comércio de gado e, mais tarde, com a indústria de laticínios, que floresceu a partir dos anos 1920.
A visita de Rodrigues Alves, em 20 de junho de 1904, deu prestígio à então nascente vocação ferroviária da cidade, embora a inauguração oficial da estação só tenha ocorrido em 5 de agosto de 1905. Em 2003, já sem os trilhos, ela ressurgia como espaço público, ganhando nova iluminação e abrigando festas populares onde antes soavam os apitos da Maria Fumaça.
Hoje, a linha férrea ainda desenha o bairro Maria Amália, margeia a BR-259 e acompanha, por um trecho, o curso do Ribeirão Santo Antônio, até se afastar rumo ao norte — como um vestígio de passado que insiste em seguir adiante. É a lembrança de uma comunidade que soube assimilar épocas e fazer da velha estação sua mais bela metáfora: um eterno ponto de partida.
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