O bem-estar na civilização


Os shopping centers provocam debates de estudiosos do comportamento humano desde os anos 1980, quando o conceito desse negócio se consolidou. Para muitos, eles são templos do consumismo e estimulam a futilidade, sobretudo a dos mais jovens. Mas a evolução da sociedade acabou dando a esses locais que agregam comércio e serviços um papel semelhante ao das bucólicas praças de cidadezinhas do interior, o da convivência social.

Em O Mal-Estar na Civilização (1929), o psicanalista alemão Sigmund Freud explica que o indivíduo se organiza em sociedade e as regras dessa regulam relações interpessoais. Tudo em nome do bem-estar geral, mas com algum prejuízo para impulsos de cada um. Hoje, quando as ruas e outros espaços públicos são ameaçados pelo crime, pela poluição e pela loucura climática, os shoppings servem para abrigar o desejo de convívio saudável e civilizado.

Não é por acaso que, antes e depois da pandemia, esse segmento tenha tido excelente performance. Os shoppings se adaptaram às demandas e o consumidor buscou neles, com ainda mais vigor, uma velha combinação de encontro, segurança e comodidade. Segundo os executivos, a venda online, que também cresceu nesse período, se expressa apenas em itens pontuais e, por essa razão, quase sempre não exige a experiência plena de compra.

“A cadeia produtiva do mundo físico prevalece e as vendas virtuais não vão na essência dos shoppings, que está no DNA do humano, um ser gregário, que precisa da convivência”, diz Vander Giordano, vice-presidente do Grupo Multiplan. Ele lista com fatores do sucesso da experiência real de compra os insubstituíveis cinco sentidos – visão, olfato, paladar, tato e audição –, coisa só possível no mundo real, por mais que se simule artificialmente.

Com eventos culturais abertos ao público, feirinhas de artesanato, reunião de idosos, vacinação e outras situações de evidente civilidade, os shoppings construíram de vez uma sólida imagem de controle e conforto. A tolerância com o lado ruim do meio urbano leva a mais deterioração. Na mão inversa, locais onde impera limpeza, organização, climatização e segurança evocam desejo por condições ainda melhores. O “Mall” agora é um bem?

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