Vodca, mentiras e corrupção


A arte imita a vida, mas a vida traz estórias bem mais ousadas. Enquanto o mundo assiste ao primeiro conflito militar em solo europeu desde a última Guerra Mundial chega às telonas de quase todos os países (Rússia entre as exceções) uma nova superprodução inspirada em Batman, maior herói dos gibis. Ambos os enredos têm um mal bem conhecido do Brasil: a corrupção.

A ficção do cinema e a realidade nas manchetes dos jornais geram suspense aos espectadores nas suas respectivas evoluções, com seus vilões ardilosos e heróis marcantes. Outros aspectos em comum entre elas são o papel das redes sociais na mobilização social a partir de fatos revelados e as verdades absurdas que todos ao menos desconfiam, mas aceitam “normalizar”. 

O filme do herói mascarado, que até insinua um tráfico de mulheres russas, algo que rola desde o fim da União Soviética, tem como principal pano de fundo o corrompimento profundo da democracia e do sistema legal. No império do novo czar, essa degeneração tem décadas e coleciona fatos que vão do envenenamento de inimigos ao comércio clandestino de armas.  

Mesmo com argumento geopolítico sólido, o de querer barrar o avanço das forças do Ocidente em suas fronteiras, o presidente Putin comete mais um crime com a condenável invasão russa à Ucrânia. Não deu para normalizar mais essa, após o mundo saber que ele e seus oligarcas lavam fortunas em times de futebol, atacam bancos de dados de instituições e escondem dinheiro na Suíça.

O blockbuster dirigido por Matt Reeves explora, por sua vez, com cores bem fortes as relações espúrias entre público e privado e até onde elas podem chegar. As verdades do passado mascaradas não conseguem se sustentar muito nos tempos interligados, mas podem estes mesmos tempos dar à mentira um poder jamais antes visto graças à assustadora velocidade, ensina o vilão Charada. 

Que o mundo consiga enfrentar os corruptos sem precisar de alguém à margem do sistema, como o Batman da ficção. A política precisa produzir respostas para acabar com os males da política e apenas a dominância da lei impedirá que as trevas da guerra e da ditadura se associem ao cinza da corrupção normalizada. A ressaca da vodca nem sempre é uma questão da marca da bebida.


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