Cabedelo versus Mariel

Por Sílvio Ribas
Cabedelo (PB) — A administração do Porto de Cabedelo (PB), localizado na cidade de mesmo nome da região metropolitana de João Pessoa, espera desde 2011 pelos recursos prometidos pelo governo federal para ampliar e modernizar a infraestrutura. Esse projeto, modesto diante das enormes necessidades dos principais terminais portuários do país, soma US$ 326 milhões. Esse valor corresponde à metade do financiamento dado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a reforma do porto cubano de Mariel, inaugurado no mês passado pela própria presidente Dilma Rousseff. Enquanto US$ 682 milhões da instituição pública de fomento ancoraram em um ponto do litoral da ilha caribenha governada pela ditadura dos irmãos Castros, nenhum centavo do Orçamento federal aportou, até agora, no mais oriental porto das Américas, que tem apresentado as maiores taxas anuais de crescimento. A opção do governo por sustentar investimento e negócio estrangeiro, em vez de apoiar um terminal portuário de propriedade da própria União e considerado estratégico para o combalido comércio internacional brasileiro e para o desenvolvimento regional, desperta a curiosidade até dos turistas que visitam as praias de águas mornas e esverdeadas ao norte da capital paraibana. Quem se desloca de carro até Cabedelo percebe o caos urbano e a carência de investimentos públicos, assim que se aproxima do complexo portuário. O tráfego intenso de caminhões pesados em ruas estreitas da cidade de 62 mil habitantes, o cinturão de 26 gigantescos tanques de combustíveis em torno do sítio arqueológico do Forte Santa Catarina (um tesouro do século 16) e uma favela que avança sobre os poucos espaços ainda livres não deixam dúvidas de que o Estado abandonou aquele lugar. “É uma pena ver um lugar tão bonito tratado desse jeito”, comenta uma moradora.
Além dos gargalos logísticos, do permanente risco de acidentes trágicos com inflamáveis, da afronta à memória do Brasil e dos transtornos aos visitantes, especialistas salientam que a falta de investimento em Cabedelo desperdiça o potencial turístico de cenários “caribenhos”, retarda a vinda de empreendimentos para a Paraíba e bloqueia ganhos de eficiência nas operações comerciais. “O terminal portuário do país mais próximo da Europa, da Ásia e da África também está exatamente no estado que divide o Nordeste ao meio, com outros quatro acima e quatro abaixo”, ressaltou Wilbur Holmes Jácome, presidente da Companhia Docas da Paraíba (CDP), empresa de economia mista que opera o porto. A CDP encerrou 2013 com movimento de 1,94 milhão de toneladas, acumulando crescimento de 38% desde 2011. A receita do terminal subiu 25% no ano passado em relação a 2012, e o total de navios atracados no período avançou 21%. Esse desempenho recorde refletiu a boa fase da economia nordestina, que inclui a atração de indústrias. “Já sondamos 14 navios de passageiros e os primeiros transatlânticos começaram a atracar, o que terá impacto no turismo local”, acrescentou Jácome, lembrando que, apesar das limitações de infraestrutura e receita, a operadora vem tocando investimentos mínimos de manutenção, no total de R$ 9 milhões nos últimos três anos. O governador Ricardo Coutinho tem apostado suas fichas na ampliação do polo cimenteiro, que ganhou impulso com o Porto de Cabedelo. O objetivo é alcançar a vice-liderança na produção nacional, com 10 milhões de toneladas anuais. Sem garantias de assistir à chegada dos recursos federais este ano, Coutinho anunciou o início das obras de construção de uma rodovia alternativa à BR 230, para transportar 450 mil toneladas de cargas do porto, orçadas em R$ 2,5 milhões. Cobrança Em março de 2013, durante a última visita de Dilma a João Pessoa, o governador cobrou publicamente à presidente que se empenhasse na liberação da verba federal para o terminal portuário. Ela não quis prometer nada. As relações entre os dois já andavam tensas com o já esperado afastamento entre seus partidos, PT e PSB, ex-aliados no plano nacional e que terão este ano candidatos próprios à Presidência da República.
Independentemente do acerto político, a ausência da União em obras pode impedir a continuidade do crescimento sustentável das operações portuárias. “Não temos recursos para todas as obras de infraestrutura, mas temos o planejamento detalhado de cada uma delas”, pontuou o presidente da CDP, que considera o apoio do Planalto fundamental. Para ele, os itens prioritários para a reconfiguração do porto são o reforço do cais, o aprofundamento do canal de acesso e a construção de um segundo terminal de uso múltiplo, com 102 mil m² e capacidade para movimentar 120 mil contêineres. “Com isso, Cabedelo seria inserido no cenário logístico mundial, recebendo tipos variados de carga, operando como ponto de apoio para portos maiores e ainda dando suporte ao crescimento industrial da Paraíba”, resumiu Jácome. O baixo custo operacional é uma vantagem competitiva do porto. Cabedelo tem o diferencial de estar localizado na foz de um rio, o Paraíba, com saídas fluvial e marítima. Além disso, é servido pela ferrovia Transnordestina, que corta outros sete estados do Nordeste e chega a outras regiões. Tesouro histórico Ao lado do Porto de Cabedelo (PB) encontra-se o forte de Santa Catarina, um patrimônio histórico que remonta a 1586, quando Portugal e Espanha foram unidos em um único reino. Depois de um ataque fracassado em 1631, os holandeses conquistaram o forte em 1634. Vinte anos de domínio holandês depois, a fortaleza voltou às mãos dos portugueses. Só em 1654 ganharia o revestimento de pedra e uma nova entrada que o caracterizam até hoje. Fonte: Correio Braziliense de hoje

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