Manifesto por Brasília: Onda de calor

Por Sílvio Ribas O calorzão que temos sentido nos últimos dias deveria referescar as ideias de quem despreza o premiado projeto urbanístico básico de Brasília. O padrão bucólio traçado por Lucio Costa precisa ser respeitado e até aprofundado para que a capital do Brasil continue sendo diferente no bom sentido, com mais verde na terra e mais azul no céu. Não tenhamos dúvida de que a avalanche de carros nas ruas, as seguidas baixas sofridas pelo bravo cerrado urbano e as construções irregulares ou liberadas sem critério são a causa do crescente desconforto nas temporadas quentes. A maioria de nossos filhos e netos tem mais consciência ecológica que nós, em virtude dos ganhos pedagógicos pós-Rio 92, embora os poderosos do planeta pouco tenham feito para mudar a velha dinâmica das emissões de dióxido de carbono. A garotada nos ensina uma equação elementar e sempre esquecida: menos verde e mais concreto é igual a menos água e mais calor. Simples assim. É a partir da esperança nas novas gerações que faço aos parlamentares distritais e ao governador um apelo: se for para mexer no planejamento urbanístico deste patrimônio cultural da humanidade, que seja em favor de mais verde, menos fiação aérea e mais água. Talvez caiba no conjunto cultural da República alguma jardinagem. Talvez. Quem sabe uma boa promessa de campanha rumo ao Palácio do Buriti seja a de plantar uma árvore por cidadão do DF, distribuindo milhões de mudas ou reforçando a cobertura vegetal de parques e recompondo áreas devastadas pelas costumeiras e criminosas queimadas. É bom deixar bem clara uma coisa: o desprezo pela natureza remanescente neste quadradinho parece gerar consequências mais graves que as já percebidas mundo afora, com o aquecimento global pelo efeito dos gases estufa. Prova disso são ilhas de calor nas cidades em volta do Plano provocadas pelos espigões e suas ondas térmicas. Quando falta água nas nossas torneiras nos períodos de pico de demanda, lembro logo que aqui estão nascentes de muitos rios do país. Quando a garganta dói com a secura, tenho a certeza de o Lago Paranoá é nossa âncora de civilidade. Quem paga impostos e vota nesta unidade da Federação precisa vencer com bom senso a batalha contra a especulação imobiliária. Sede e calor podem ser domados aqui de forma inteligente e elegante (ou sustentável, para ser atual) sob pena de termos de resolver nossos desatinos ambientais com oásis artificiais, a exemplo das zonas áridas de alta renda tipo Dubai. Fonte: Página de Opinião, Correio Braziliense, 14 de novembro de 2013.

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