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SÍLVIO RIBAS
O primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi, não conseguiu resistir à longa escala de pressões internas e externas e aceitou renunciar. Apesar de o Parlamento ter confirmado, ontem, o Orçamento de 2010, a votação apertada deixou claro que O Cavaleiro, como é conhecido, já tinha perdido a maioria parlamentar. O humilhante resultado foi fatal. No início da noite, após se reunir com um desgastado Berlusconi, de 75 anos, o presidente da Itália, Giorgio Napolitano, anunciou que a renúncia sairá logo que o chefe de governo consiga aprovar medidas de ajuste fiscal cobrados pela União Europeia (UE). “O mais importante é trabalhar pelo bem do país. Temos que nos preocupar com o fato de que os mercados não acreditam que a Itália será capaz de aprovar as medidas que a Europa exige”, acrescentou.

Como prometido, a oposição se absteve de votar e Berlusconi conseguiu ratificar as contas do governo por 308 dos 630 votos da Câmara dos Deputados, abaixo da maioria absoluta (316). Além da pífia votação de ontem, Berlusconi teria de enfrentar este mês voto de confiança dos parlamentares, vinculado às medidas definidas pela UE em 27 de outubro. Neste contexto, o rendimento do bônus italiano com vencimento para dez anos atingiu ontem depois da votação do Orçamento seu recorde desde a criação do euro: 6,77%.

Os juros pagos pela dívida soberana da Itália — US$ 2,6 trilhões, 120% do seu Produto Interno Bruto (PIB) — subiram a níveis que mostram profunda preocupação de que a terceira maior economia da eurozona, estagnada há uma década, não possa cumprir os compromissos. Os mercados têm criticado a Itália há várias semanas pela política pouco rigorosa defrontada com o agravamento da crise. Nesse embalo, boatos sobre a renúncia de Berlusconi e as cobranças para que deixasse o governo cresceram nos últimos dias, em meio à desconfiança de que a perderia o teste de ontem, além de desdobramentos da crise grega, que derrubou o primeiro-ministro George Papandreou, e o crescente receio de que a Itália tenha de recorrer à ajuda internacional para pagar suas dívidas.

A UE e os mercados financeiros temem que a necessidade de um plano de ajuda imploda o euro, levando a economia global junto. “A situação na Itália é muito preocupante e a Europa está seguindo a situação atentamente”, disse o comissário de Assuntos Econômicos do bloco, Olli Rehn, que lamentou a incerteza em torno do país, que perdeu ano passado para o Brasil a posição de sétima maior economia do planeta. Antes da ratificação do Orçamento da Itália, países do bloco também alertavam que o país era “grande demais para quebrar”. “É difícil a Europa ter recursos para colocar um país do tamanho da Itália num programa de resgate”, discursou o primeiro-ministro da Finlândia, Jyrki Katainen. “A Itália sabe que, por seu tamanho, não pode receber ajuda externa. Por isto, deve fazer sacrifícios”, acrescentou a ministra austríaca da Economia, Maria Fekter.

Momentos depois, no parlamento italiano, oposicionistas e aliados pediam a renúncia de Berlusconi. “O governo não tem maioria nesta casa”, afirmou Pierluigi Bersani, líder do Partido Democrático (PD), o maior da oposição. “Este governo não é capaz de gerenciar a situação e enfrentá-la. E este deficit de credibilidade é fundado nos números”, declarou. O líder da Liga Norte, Umberto Bossi, principal aliado do primeiro-ministro também já havia pedido a saída dele. “Pedimos ao primeiro-ministro que desse um passo para o lado e renunciasse”, disse Bossi. Ele sugeriu que Angelino Alfano, secretário-geral do Partido da Liberdade (PDL), de Berlusconi, e sucessor natural do próprio assumisse o governo.

Com a desistência de Berlusconi, cabe ao presidente Napolitano decidir se convoca eleições antecipadas ou se nomeia novo gabinete indicado pela maioria. Em caso de impasse, o chefe de Estado pode, em último recurso, convocar eleições gerais. Um dos nomes mais citados para liderar um eventual governo técnico é o de Mario Monti, de 68 anos, atual presidente da Universidade Bocconi de Milão e presidente honorário do Bruegel, centro de pesquisa política e econômica europeia, que fundou em 2005. A oposição ainda não conseguiu indicar um líder forte para oferecer como alternativa a Berlusconi. Desde seus dois primeiros mandatos, em 1994 e de 2001 a 2006, os opositores de centro-esquerda o acusavam de priorizar interesses empresariais, em prejuízo das necessidades do país.

Berlusconi, um extravagante magnata da mídia de 75 anos, envolvido há anos em escândalos sexuais e processos criminais, avisou no fim de semana que tinha maioria para governar. Na segunda, o político de centro-direita garantiu que não iria renunciar. Para tentar angariar confiança e se proteger das pressões que migravam da Grécia para a Itália, Berlusconi pediu ao Fundo Monetário Internacional (FMI) durante a reunião de cúpula do G-20, na semana passada, que monitore trimestralmente as reformas econômicas do país. Não foi suficiente.


Não publicado originalmente em 9 de novembro.

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