Deu a louca nos preços

Por Sìlvio Ribas Correio Braziliense - 21/02/2011









O movimento do câmbio e o aumento do padrão de vida das pessoas elevam às alturas o valor de determinados itens do dia a dia

Bicicleta mais cara que um carro popular, avião mais barato que uma caminhonete e até biquíni custando o equivalente a duas piscinas de fibra de vidro. Exemplos de preços “malucos” como estes estão virando rotina no mercado brasileiro. A explicação para casos que desafiam o senso comum vão desde a valorização recorde do real, até grandes escalas de produção industrial, passando por crescentes hábitos de consumo sofisticados.

Especialistas acreditam que outros fatores alheios à elementar lei da oferta e da procura passarão também a interferir mais na formação de valores de produtos em prateleira. “Essa aparente bagunça dos preços tende a crescer, sobretudo com a estagnação de países ricos e o deslanchar de emergentes”, avisa Marco Quintarelli, consultor em tendências de consumo. Para ele, ficará cada vez mais difícil dizer o que é caro ou barato, em parte graças à popularização do acesso a importados e ao crédito facilitado.

Os brasileiros já estão acostumados a pagar menos pela passagem aérea que pela corrida de táxi ao aeroporto e também não estranham vaga de garagem valendo mais que o próprio automóvel. Quintarelli avalia que isso reflete a melhora da renda das classes C e D no mundo, estimulando gastos supérfluos sem peso na consciência. “O consumidor se convenceu de que pode se presentear, favorecendo os ramos de conveniência, bem-estar e saúde”, conta.

A maluquice dos preços ganhou também outro incentivo nos últimos anos, envolvendo construção de marcas. Canais de distribuição on-line e a divulgação em redes sociais da internet ampliaram o leque de produtos e serviços estreantes e competitivos. “O comprador está cada vez menos fiel às marcas tradicionais, prestando atenção em comportamentos de grupo e em indicadores de qualidade”, diz Quintarelli.

Foi pensando nas vantagens comparativas que o médico Daniel Prado, de Brasília, optou por um avião para fazer viagens. Pagou R$ 100 mil por um modelo para dois passageiros, mais barato que uma caminhonete sofisticada, buscando mais rapidez e segurança nos itinerários. A velocidade de cruzeiro chega a 160 quilômetros por hora, mas a bagagem não passa de 20 quilos.

Seu ultraleve com cabina consome quase o mesmo de gasolina por quilômetro, com vantagem de fazer trajetos encurtados por linha reta. “Com tempo bom, vou ao litoral em cinco horas, quatro vezes menos que de carro”, diz. Ele acrescenta que outro ponto a favor, além da vista, é escapar de estradas ruins. Prado acredita que cada vez mais profissionais liberais e fazendeiros optarão por esse meio de transporte, que tem 12 fabricantes nacionais.

O dólar desvalorizado e a alta dos alimentos vêm criando disparates nas gôndolas, com queijo francês mais em conta que o nacional e bacalhau mais acessível que filé mignon. Chocolate suíço e doce de leite argentino até caíram no gosto popular. No lado inverso, ainda há consumidores dispostos a pagar R$ 2,8 mil por um celular com tela sensível ao toque. O valor contrasta com computadores vendidos em lojas de departamentos por menos de R$ 1 mil.

Em Brasília também é fácil encontrar bicicletas mais caras. A SLM Limited, da Fuji, feita com uma liga de carbono e voltada para alta performance, pesa nove quilos e custa R$ 29 mil. Apesar da existência de bicicletas mais caras que carros, analistas lembram que a carga tributária, que vai de 27% a 40% do preço total, deixa o automóvel popular no país mais caro que um de qualidade superior nos Estados Unidos.

Mesmo assim, para os casos de compras extravagantes, a tendência é de crescimento. O Brasil tem cerca de 150 mil pessoas consideradas milionárias do ponto de vista de seu consumo, conforme levantamento recente do banco americano Merril Lynch. Esse universo garantiu um faturamento de R$ 13 bilhões às empresas do mercado de luxo em 2010, que venderam 22% a mais que o ano anterior.

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