Minha pequena sorte grande


Sílvio Ribas

Ao longo da minha vida, certos fatos foram surgindo como sussurros da fortuna — dádivas singelas que me faziam crer no dia em que o destino me brindaria com algo maior. A verdade é que o meu sucesso ocasional em sorteios e jogos de azar em nada mudou os rumos da minha caminhada.

Essas alegrias breves compõem a minha pequena sorte grande — esse curioso privilégio de ganhar sem frequência, sem método, só no acaso. E ela começou na minha sertaneja Curvelo (MG), lá nos anos 1980, no ponto mágico da lendária Esquina da Sorte, na borda da Praça Benedito Valadares. 

Entre imagens de santos, velas e outros objetos místicos, reinava ali pacificamente o sincretismo brasileiro e a fé cotidiana dos apostadores do jogo do bicho. Minha superstição adolescente se limitava ao trevo de quatro folhas e um a figa de madeira, comprados ali mesmo e sempre no bolso. 

Foi aos 12 anos, na Esquina da Sorte, que me ocorreu o primeiro assombro da pequena sorte grande. Na ida para a escola, achei no chão uma moeda prateada de 50 cruzeiros, que brilhava entre as pedras do calçamento. Na noite anterior, sonhara com uma borboleta flutuando no quintal de casa. 

Ao longo daquele dia, cruzei ainda com o número oito tantas vezes que comecei a vê-lo em placas, muros e papeis soltos. Sem entender muito bem o porquê, fui até o tradicional local de apostas e joguei na dupla dos grupos 4 (borboleta) e 8 (camelo). É não é que esse par de bichos foram sorteados?

No dia seguinte, saí com 20 vezes o valor da moeda, um total equivalente hoje a uns R$ 40. Essa “bolada” se derreteu logo em sorvetes e chicletes. Nunca mais joguei na contravenção, mas ainda me lembro da moça que anotou meus palpites num caderno gasto por trás de um balcão escondido.

Meu avô paterno, ao saber da história, protestou: “Você tinha o recado dos céus e jogou só uma moedinha?”. Na verdade, a sorte sorriu nesse episódio várias vezes, desde o dinheiro na rua até o sonho clarividente, passando por aparições do insistente número. Sorte não tem controle ou explicação.

A sorte me encontrou outras vezes, tais como em 1994, no primeiro regabofe como jornalista, de onde ganhei num sorteio do Clube de Diretores Lojistas (CDL) em BH duas passagens e hospedagem para Bali — que tive de recusar devido à dura norma de conduta da Gazeta Mercantil, onde trabalhava. 

Em 2009, fui brindado com garrafa de uísque premium em rifa da Loja Maçônica de Brasília. Já em 2010, acertei pela primeira vez a quadra da Mega-Sena e com o valor comprei um brinquedo para meu bebê. Ganharia outra quadra em 2019, usando o bilhete premiado para pagar serviço banal.

Em 2016, durante um coquetel em homenagem aos 50 anos de Singapura, num clube da capital federal, fui o sorteado com o terceiro brinde da noite, um kit de livros sobre a história daquela cidade-estado. Valeu a fotografia para as redes sociais com o representante de negócios dos singapurenses. 


 


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