Previdência: reforma inadiável

Sílvio Ribas

O governo do presidente Michel Temer (PMDB) vai apresentar uma proposta de reforma da Previdência Social como parte do esforço para fazer o país reencontrar o equilíbrio fiscal e, ainda, garantir a solvência do próprio sistema previdenciário para as atuais e futuras gerações. São mudanças urgentes, debatidas há anos e cuja necessidade está explicitada em números graves e perspectivas explosivas.

O gasto com aposentadorias e pensões já consome um décimo do Produto Interno Bruto (PIB), a soma de todas as riquezas do país, proporção que deverá dobrar até 2060, se nada for feito, conforme estudo recente do Ipea. A meta orçamentária prevê um rombo este ano de R$ 146,3 bilhões nas contas da Previdência, montante próximo ao déficit federal estimado para 2016, de R$ 170,5 bilhões.

A Secretaria do Tesouro Nacional informou no fim de agosto que o rombo da Previdência Social (sistema público que atende aos trabalhadores do setor privado) avançou de R$ 39,11 bilhões nos sete primeiros meses do ano passado para R$ 72,26 bilhões em igual período de 2016. Um aumento de 83,4%!

Recentemente, o governo elevou para R$ 149,23 bilhões a sua previsão para o déficit da Previdência Social em 2016. Em 2015, a Previdência registrou resultado negativo de R$ 85,81 bilhões. Isso significa 75% de ampliação de um ano para outro! A queda de arrecadação em virtude do desemprego crescente, a perspectiva de envelhecimento da população e, por fim, as concessões generosas de benefícios levaram a esse quadro angustiante.

A equipe econômica do presidente informou desde a sua interinidade que pretendia levar adiante uma reforma das regras da Previdência e procurou discutir alternativas com as centrais sindicais. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, defendeu logo de início que se fixe idade mínima para a aposentadoria pela INSS, o que gerou resistências.

O desafio não é pequeno. O desequilíbrio inter-gerações e a cifra já pesada do gasto com o sistema previdenciário apontam para um quadro de colapso nas contas públicas e no funcionamento do Estado. Pelos cálculos do Ipea com base na projeção demográfica da ONU, em menos de 50 anos o país gastará, só com Previdência, um quinto do PIB, chegando a 24,7% em 2100.

Ano passado, a despesa com aposentadorias, pensões e benefícios assistenciais (pagos a idosos e deficientes da baixa renda) atingiu R$ 583,3 bilhões, somando trabalhadores do setor privado e servidores federais. O valor representou 50,3% da despesa primária total da União ou 9,9% do PIB. Demais benefícios como auxílio-doença, acidentários, não foram incluídos nos cálculos.

São três as razões apontadas pelo Ipea para uma reforma.

1) A despesa do INSS não para de subir: de 4% do PIB nos anos 1990 para 7,4% em 2015 e 8% este ano;
2) Se somar o regime próprio da União aos benefícios assistenciais, o gasto alcança 12%, mesmo patamar de países onde a proporção de idosos éo dobro do Brasil;
3) O envelhecimento vai continuar pressionando a despesa.
A população de 15 a 64 anos, na qual se concentram os contribuintes da Previdência, será menor em 2060. Enquanto isso, a de 65 anos ou mais chegará nesse prazo como o triplo da atual. Hoje há cerca de dois contribuintes para cada beneficiário. Sem reforma, em 2060 haverá mais beneficiários que contribuintes.

O desafio previdenciário é também global. Um grupo de 46 países já aumentaram ou estão em processo de elevação da idade para aposentadoria. Entre eles, Alemanha, Austrália, Cuba, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos e Reino Unido. Portugal elevou a idade mínima de 65 para 66 anos e a Coreia do Sul, sairá de 61 para 65.

Desses países, 16 já eliminaram ou vão eliminar a diferença de idade entre homens e mulheres para requerer aposentadoria. Em 174 países,116 (ou 67% do total) não há diferenças entre gêneros.

O estudo do Ipea também derruba o mito de que a idade mínima prejudicará os pobres. Isso porque os menos favorecidos quase sempre não conseguem provar 30 ou 35 anos de contribuição, pelo fato de trabalharem mais na informalidade, se aposentando aos 60 anos ou pela Loas, aos 65. Os trabalhadores de renda maior se aposentam aos 54 na média, apóscontribuir 30-35 anos.

O governo sabe que a limitação das despesas públicas e a reforma da Previdência são imprescindíveis para um horizonte fiscal seguro. Sem vencer essas medidas não haverá crescimento econômico.

O desequilíbrio entre receitas e despesas previdenciárias é um fantasma que assombra o país desde 1995, quando as contas da Previdência passaram a apresentar déficits crescentes. A estabilização da moeda deixou explícita uma realidade que exige reformas estruturais. Tais mudanças não podem ser mais adiadas. 

Comentários