Horizonte trêmulo


Por Sílvio Ribas
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, convocado para arrumar a casa com suas “mãos de tesoura”, parece ter perdido a sua razão de ser. A austeridade esperava dele foi sendo, dia após dia, desmontada por uma série de revelações de rombos ainda mais largos.

A meta de ajuste recuou acentuadamente e nem deverá ser cumprida, o retorno da CPMF entrou na roda e, por fim, a proposta orçamentária de 2016 trouxe uma sincera meta deficitária de R$ 30,5 bilhões. Há especialistas que acreditam num buraco duas vezes maior em razão de gastos omitidos e das inconsistências de receitas.

Sem credibilidade, a desconfiança avança junto com o dólar, com os juros, com a dívida federal e com a desarmonia entre os entes federados. É uma rodovia fervente a produzir horizonte trêmulo. Mandar ao Congresso um Orçamento vergonhoso é, na prática, uma confissão de derrota e um grito de socorro do Executivo ao Legislativo.

O gosto amargo de anos de irresponsabilidade fiscal emerge de uma peça orçamentária realista após uma série de mentiras. O fato complicador é que a presidente Dilma Rousseff pensa diferente de seu ministro da Fazenda, mas morre de medo de perdê-lo. As expressões faciais dele não deixam, por sua vez, dúvidas de que está mesmo consciente da gravidade da enrascada em que se meteu.
A presidente abdicou da condução da economia mas, contudo, sem retirar obstáculos à solução. Ela também transferiu a articulação política sem se abrir ao diálogo verdadeiro, deixando a agenda nacional à deriva. Por fim, lava as mãos para os estragos nas contas públicas.

O que significa um presidente abrir mão de fazer Orçamento? Que jogou a toalha? Os números maquiados começaram a ser escancarados, tornando cada vez mais difícil para o governo convencer a sociedade e o mercado que ainda governa. Em meio a toda essa tragédia fiscal produzida pelos seus próprios erros, o governo deveria dialogar com a sociedade para encontrar o caminho a ser trilhado daqui até algum ponto futuro.
Lamentavelmente, o que temos visto é um governo tentando fincar estacas em terreno cada vez mais movediço. Era óbvio que, cedo ou tarde, a tal nova matriz econômica seria abandonada ou afundaríamos numa crise aguda. As contas externas, que apresentavam deficits crescentes, também apontavam para a necessidade de correções cambiais adiante. Nesse contexto, o investimento decaiu radicalmente, levando o PIB junto, à espera de mudanças reais no horizonte trêmulo da política econômica.

O encolhimento do PIB de até 2,5% em 2015 já estava anunciado na estagnação do ano passado. As quedas de 0,7% no primeiro semestre e de 1,9% no segundo deixaram evidentes que o ajuste proposto foi um fracasso, com as receitas fiscais ladeira abaixo. A presidente não convenceu de que foi surpreendida pelos fatos e nem de que as agruras do país são produto de fatos internacionais, particularmente vindos da economia chinesa.
O saldo da perda de credibilidade é o perigo iminente de adentramos em um caos econômico mais grave, com perda do selo de bom pagador dado pelas agências de classificação de risco. Levy era vendido como solução e a presidente deixa que seja agora confundido como o problema. Não há, até agora, nenhum sinal indubitável de que a presidente compreende a real situação da economia e, principalmente, de que ela mudou as suas convicções equivocadas sobre a política intervencionista. Com isso, não há coesão sequer em sua equipe econômica.

O desequilíbrio histórico que impôs as contas públicas se tornou um imbróglio difícil de ser corrigido, um monstro que nutre de seus próprios venenos. As manobras desvendadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) não servem mais para enjaular a fera. As contas federais no vermelho desafiam agora o Legislativo a encontrar as saídas negadas pela incapacidade do governo.

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