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Mostrando postagens de julho, 2020

Dois por um real

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Sílvio Ribas Um gesto antes de um simples enunciado pintou com cores pesadas uma cena com a qual eu convivia milhões de vezes nos cruzamentos  das ruas paulistanas. Um menininho bem pequeno e bem vestido me ofereceu na janela do carro dois tubos de guloseimas “por um real”. Cato moedas, acompanhado pelos olhos e pela voz dele (contando) até somar o preço pedido. Despejo o dinheiro na mãozinha dele e dispenso o produto comprado. Ele insiste. Falo pra deixar pra lá, vender de novo. Aí ele vem nervoso soltando uma frase cortante: “Vai. Pega logo, tio, pra acabar mais cedo”. Peguei. Senti-me frágil, quis chorar  de remorso ao tomar ciência ali entre duas vias de Pinheiros o que ocorria debaixo dos narizes de milhões e sob o gritante silêncio do Estado que não faz o que deve fazer. Criança na rua, explorada. Infância desperdiçada, futuro comprometido. Pais opressores, país desnaturado e tudo o mais que sabemos e deixamos pra lá. E cadê o meu humanismo, minha cultura cristã,...

O poop é pop!

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Sílvio Ribas Ei,  quem fez caca? Que m* é essa! Mas que b*! Ora, seu estrume! Oh, Shit! Agressões verbais como essas, que recorrem às muitas alcunhas da coisa mais abjeta para os humanos, seja lá qual for sua origem ou cultura, estão mais comuns do que nunca. Na verdade, o velho número dois não está só mais aceito. Agora, muito além dos xingamentos e das piadas escatológicas, o cocô virou artigo cult e até chega a ser entronizado pela cultura de massa. Em matéria de asco individual e coletivo, fezes sempre foram unanimidade individual e universal. Mas como símbolo e personagem, em várias cores e acepções (assépticas ou não), elas se tornaram fonte de crescente lucro para a indústria do entretenimento. Estranhos tempos esses que colocam a excrescência em essência no posto de destaque jamais experimentado.    Parênteses: Roberto Carlos não vestia marrom por puro preconceito? O que era visto apenas no besteirol cinematográfico, com graça e nojo, se transformou em simpáticos ...

O baião dos Beatles

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Sílvio Ribas Sempre existiram fake news, ou seja, notícias falsas. Mas poucos são os grandes boatos que produziram mais efeitos positivos que negativos. O melhor desses casos foi, sem dúvida, quando, em 1968, espalhou-se pelo país a boa nova de que os Beatles iriam gravar Asa Branca, consagrada canção do mestre pernambucano Luiz Gonzaga (1912-1989), o Rei do Baião. O grupo musical mais popular da história estava, de fato, numa fase de experimentalismo acentuado, tendo lançado o revolucionário álbum duplo Sargent Pepper’s Lonely Heart Club Band no ano anterior. Daí porque ganhou verossimilhança a lorota segundo a qual o famoso quarteto inglês estaria debruçado numa versão para o hino nacional do Nordeste brasileiro. Especulações de que a obra-prima de Gonzagão sairia no chamado Álbum Branco foram registradas pelo jornal O Estado de S. Paulo , em 21 de agosto do ano que não terminou. Dizia-se que o brasileiro levaria um adiantamento de US$ 50 mil, uma bolada naquela época,...

Adorável trapalhão francês

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Sílvio Ribas A comédia que atraía a gurizada para as salas de cinemas nos anos 1970 e 1980 não se limitava a Os Trapalhões. Além de Mazzaropi, ainda tínhamos as divertidas aventuras de Louis de Funés, maior comediante francês de todos os tempos. Enquanto Jerry Lewis reinava nos papeis cômicos televisionados, os que víamos só na telona davam o trono ao gaulês. Protagonista de várias produções, o ator tinha no sargento Ludovic Cruchot, o policial militar bagunceiro do balneário de Saint Tropez, seu personagem mais conhecido, que brilhou em série cinematográfica própria de sucesso internacional. O gendarme, ao lado do chefe Jérôme Gerber, interpretado por Michel Galabru, fazia gargalharem até as poltronas do Cine Virgínia, em Curvelo, lá no meu sertão de Minas. Dos longas estrelados por Funès que assisti na minha feliz infância, lembro com mais carinho de O Gendarme e Os Extra-Terrestres (1979), no qual ele e seus companheiros de armas combatem alienígenas que se misturava...

De Mimi a Michelle

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Sílvio Ribas Separadas por intervalo de quase 50 anos, elas usufruíram – cada uma à sua época – de quartos na Casa Branca reservados a jovens presidentes dos Estados Unidos, líderes eleitos pelo Partido Democrata e detentores de um magnetismo global. Tais semelhanças são, contudo, as únicas percebidas nas trajetórias das americanas Mimi Alford, estagiária e amante de John Fitzgerald Kennedy, e Michelle Obama, a carismática esposa de Barack. Essas mulheres descrevem retratos perfeitos de dois momentos da História no mais poderoso país do planeta. Confrontados, seus perfis e biografias revelam o prólogo e o estágio mais recente de uma revolução de costumes ainda em curso. Por cerca de meio século, longevas batalhas por igualdade de oportunidades para gêneros e raças colecionaram importantes vitórias. Mesmo tendo como pano de fundo comum a Presidência de dois influentes e inspiradores políticos, os livros de Mimi e Michelle, respectivamente Era uma Vez um Segredo (2012) e ...