O papel roxo da maçã
Na minha sertaneja Curvelo (MG) dos distantes anos 1970 e 1980, cada detalhe da vida cotidiana parecia querer contar algo superior, que merecia ser notado e louvado. Por isso, a chegada de algo novo na cidade virava logo um acontecimento para a nossa gente. As maçãs argentinas, por exemplo, vinham do importador de Belo Horizonte como pequenos tesouros embalados no mistério de um mundo bem mais vasto e elegante do que o nosso atual. O aroma doce que se desprendia delas anunciava prazer reservado às ocasiões especiais. A sensação de fresca novidade que pousava na geladeira ou na cesta da cozinha, antes mesmo de as frutas serem desembrulhadas, não perecem na memória. Essas maçãs eram diferentes de tudo que se colhia nos quintais e sítios. Brilhavam como se polidas à mão, cada uma cuidadosamente protegida pelo sublime papel de seda roxo. Para nós, crianças, o invólucro parecia manto de nobreza e a cor da paixão. Por isso, tinha algo quase cerimonial em descobri-las — um gesto lento, ...