Meu quintal, meu mundo

Nos fundos da minha casa na Rua Sete de Setembro, bem no coração de Curvelo (MG), existia um rico universo paralelo que servia de refúgio encantado para minhas aventuras. Aquele quintal de cenários variados juntava árvores frutíferas, vasos de flores, canteiros de roseiras, uma parreira, varais e terreiro muitas vezes modificado. Com o tempo o velho barracão deu lugar a uma pequena piscina azul de alvenaria onde dei os meus primeiros mergulhos. Que saudade dos distantes anos 1970 e 1980!

Por um portão sempre aberto acessávamos a extensão daquele espaço para o seu correspondente na residência da minha segunda mãe, Arminda. Lá estavam uma gigantesca mangueira de docíssimas mangas pequi, um galinheiro, uma horta, uma lavanderia aberta e com pilões, fornos e mesas para trabalho artesanal, além de um velho barril de aço que vivia transbordando.

O território de sonhos e brincadeiras era um verdadeiro paraíso infantil. Travessuras e encenações do que víamos na tevê ocorriam sempre por ali. A jabuticabeira nos convidava a subir até o último galho atrás das suas negras e doces recompensas. As uvas roxas estavam ali aos cachos e ao alcance de nossas mãos pequenas e ávidas. Para completar, uma goiabeira com o tronco descascado. Inúmeros insetos faziam por lá as suas visitas diárias, acrescentando um toque de vida selvagem ao nosso espaço colonizado. Brinquedos espalhados pelo chão e outras tralhas largadas, em meio à grama e à terra, esperavam ansiosos pelas novas missões dadas pela garotada arteira.

Um sapo grande e feio era o morador mais discreto daquele terreno, sempre escondido debaixo de uma enorme pedra, enquanto um banco esculpido em uma única peça de rocha retirada de um rio servia de descanso para nós após corridas, peladas, esconde-esconde e braçadas nos milhares de litros de água com cloro. Limões colhidos no pé se transformavam em limonadas geladas várias vezes ao dia, refrescando nossas gargantas depois de tanta algazarra.

Aquele espaço era também onde conversas secretas ganhavam oportunidade e onde as maquinações mais arriscadas dos meninos ocorriam, que por vezes resultavam em machucados leves. O tanque de lavar roupa na beira da casa, muitas vezes, se transformava na parada final dos nossos dias intensos, com banhos reforçados para remover a sujeira e o suor acumulados nas travessuras.

Por fim, os muros de placa de cimento pré-moldados podiam servir de painéis para desenhos com carvão, giz e caco de telha enquanto dividiam o nosso querido quintal de outros dos vizinhos e com o eterno lote vago que instigava nossos medos e imaginações com suas ameaças e mistérios. De lá vinham as mamonas para o arsenal de guerrinhas, com seus ramos pendidos para nosso lado.

Naquele canto a céu aberto da minha casa, da cidade onde nasci e cresci e do meu coração, cada detalhe era imbuído de uma mágica única. O quintal da minha casa não era apenas um espaço físico, era um mundo inteiro à minha disposição, onde fantasia e realidade se abraçavam alegremente, criando memórias inesquecíveis que guardo com carinho até hoje.

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